terça-feira, 6 de maio de 2025

Das minhas escritoras favoritas


 

As saudades do que não aconteceu

Um dia perguntaram-me de que é que eu tinha mais saudades. Esperei um instante. Não pensei em pessoas, nem em lugares, nem em momentos passados. A resposta veio-me com uma certa melancolia: "Daquilo que não fiz."
Porque há uma dor estranha, silenciosa, que habita no que não chegou a ser. No beijo que não se deu, na viagem que se adiou, na conversa que não se teve coragem de começar. É como se a vida nos deixasse sempre à beira de um caminho alternativo, feito de possibilidades que se apagaram, antes mesmo de existirem.
É fácil lembrar o que vivemos. Há memórias, há fotografias, há provas. Mas o que não fizemos... isso vive apenas dentro de nós, numa zona onde o tempo não toca, mas onde a imaginação insiste em voltar. E nessas voltas criamos versões do que podia ter sido: se tivéssemos dito sim, se tivéssemos arriscado, se tivéssemos amado sem medo.
Talvez a saudade do que não fiz não seja só arrependimento. Talvez seja também uma forma de aprender. De perceber que cada escolha é uma renúncia, e que o tempo não perdoa indecisões eternas. Mas ainda assim, é uma saudade que pesa - porque o que não fizemos, paradoxalmente, continua a fazer parte de nós.
E por isso, hoje, se me voltarem a perguntar de que tenho mais saudades, não hesito: daquilo que não fiz. Porque esse vazio é meu, é único, e é nele que encontro a vontade de não deixar o futuro escapar pelos mesmos silêncios.
Helena Sacadura Cabral.

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