Vivo num país a quem dei o melhor de mim sem nunca pestanejar nem hesitar. Sem perceber “um boi” da política que originou o eclodir da guerra no então denominado “ultramar” ofereci-me para cumprir voluntariamente a parte que era exigida e obrigatória a todos os mancebos saudáveis iguais a mim, porque sem essa obrigação resolvida não havia “pão cozido” para ninguém, ou seja, possibilidade de qualquer emprego e vida estáveis.
Toda a minha vida paguei pontualmente as minhas contas, os meus impostos e obrigações. Sem falhar uma só vez. E continuo a fazê-lo ainda que já sem a convicção de estar a colaborar para o bem-estar comum daqueles que me rodeiam e amo, assim como dos meus concidadãos em geral.
Quem é que se importa com isso?
Ninguém. Porque é considerada uma obrigação, um dever de cidadania.
E pelo cumprimento dos direitos de cada contribuinte/cidadão quem é que zela?
Ninguém, também.
O oportunismo e incompetência que campeiam por todo o lado, sector público, privado, ou público-privado é de tal ordem revoltante que, se pudesse, não pagaria nem mais um cêntimo, porque sei que os meus impostos irão ser usados para aqui e acolá, para tapar buracos de milhões que nunca devi a ninguém, para altos ordenados e comissões a CEOS e Administradores, Doutores e Engenheiros, Políticos, Banqueiros e seus derivados.
Já o meu vizinho, coitado, até a luz de presença da campainha da sua porta optou por desligar para poupar energia elétrica que tem de pagar dos trezentos e trinta euros da sua “brutal” pensão de reforma.
Vivo num país em que os pensionistas idosos atacados de moléstias próprias da sua provecta idade passam horas nas urgências como se fossem meros móveis a decorar as salas de espera, torcidos nas cadeiras de rodas já sem posição de estar por tanto tempo ali sentados, em que o mais simples exame tem de ser minuciosamente analisado nas secretarias para posteriormente ser ou não autorizado pela administração, e, quando é, ficar marcado para dali a vários meses.
A título de – mais um – mero exemplo, a minha companheira de vida necessitou de uma cirurgia urgente para ablação da vesícula. E por ser portadora de doença cardíaca crónica medicada com anticoagulantes, a nossa médica de família alertou que em virtude desses condicionalismos ela não devia arriscar ter de ser operada de urgência. Requereu por isso, a quem de direito, marcação da respetiva consulta de cirurgia.
De facto na semana seguinte – fevereiro de 2023 – foi convocada. E, perante todos os condicionalismos já descritos, confirmada a necessidade da intervenção cirúrgica oportunamente detetada pela médica de família.
Mas…
A lista de espera naquele hospital para cirurgias era tão grande que a cirurgiã – com vergonha até de o dizer (textualmente as palavras que a doutora proferiu para nós) – só conseguiria operá-la em novembro seguinte.
Dali a dez meses.
Resultado. Resolver no privado pagando do nosso bolso. Vão-se os anéis, fiquem os dedos…
A esmagadora maioria dos atuais pensionistas/enfermos trabalhou e descontou durante a sua vida inteira – eu próprio contabilizei quarenta e um anos certinhos desses descontos porque até me foi exigido o pagamento integral dos três anos do serviço militar e comissão de serviço na guerra em Angola, e que, por ser uma soma tão avultada para o meu modesto vencimento mensal, tive de pagar em prestações descontadas mês a mês durante cinco anos – mas conheço outros, como por exemplo o meu cunhado mais novo, que fez descontos durante mais de cinquenta, dos 14 aos 66 anos.
Pergunta pertinente:
- Quem defende as pessoas que têm de suportar dores e consequente falta de qualidade de vida durante esses longos meses – anos até – de espera?
Ninguém!
Pelo contrário. Tudo isso é aceite como normal.
Porém, contra todas as possibilidades de se conseguir entender, na recente campanha eleitoral – nada acontece por acaso – os dois candidatos dos dois partidos vencedores, muito provavelmente por excesso de cansaço foram acometidos de doença súbita com necessidade de atendimento hospitalar urgente.
Foi notícia em toda a Comunicação Social.
Pergunto de novo:
- Alguém viu esses dois doentes com a fitinha amarela no pulso nas urgências dos respetivos hospitais à espera da sua vez para serem atendidos?
Pois…
É isso mesmo:
- Ninguém!
Quem acredita – ainda – que há almoços grátis, desengane-se. Vai ser só uma questão de tempo.
José Coelho