sábado, 29 de setembro de 2018

A nossa vida é uma constante aprendizagem...


Sábado 29 Setembro de 2018, duas da tarde. Sentado à mesa a terminar o almoço e a ouvir Fátima Lopes a conversar com a sua convidada, uma grande senhora que muito admiro: Helena de Sacadura Cabral.

Diálogo ameno, interessante, a transmitir em toda a sua plenitude a elevada estrutura ética e moral da entrevistada. E, entre muitas outras revelações sobre si e a sua relação com os filhos, Helena de Sacadura Cabral proferiu uma frase do seu Paulo, um dia que a foi encontrar muito chorosa em virtude de alguém a ter magoado e desiludido:

- Chora-se por um pai. Chora-se por uma mãe. Chora-se por um irmão. Não se chora por alguém que nos fez mal...

Entendi o profundo alcance e o infinito sentido de justiça de tão inteligentes palavras. Obrigado Dona Helena. Adoro ouvi-la, sempre...

sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Bom fim de semana...

Outono na Beirã - Fotografia que fiz no cancho da Cavalinha

Poetas nossos...

Mais um dos meus pores do sol pelos campos da Beirã

Alentejo

Folheia-se o caderno e eis o sul
E o sul é a palavra. E a palavra
Desdobra-se
No espaço com suas letras de
Solstício e de solfejo
Além de ti
Além do Tejo.

Verás o rio e talvez o azul
Não o de Mallarmé : soma de branco e de vazio
Mas aquela grande linha onde o abstracto
Começa lentamente a ser o
Sul.

Outro é o tempo
Outra a medida.

Tão grande a página
Tão curta a escrita

Entre o achigã e a perdiz
Entre o chaparro e o choupo

Tanto país
E tão pouco

Solidão é companheira
E de senhor são seus modos
Rei do céu de todos
E de chão nenhum

À sombra de uma azinheira
Há sempre sombra para mais um

Na brancura da cal o traço azul
Alentejo é a última utopia

Todas as aves partem para o sul
Todas as aves : como a poesia.


Manuel Alegre

quinta-feira, 27 de setembro de 2018

Histórias do Cota (que o livro não conta)...

Foto de 1979

"Era aquele velho guarda um homem bom. De Alpalhão. Infelizmente já não está entre nós. Não tenho dúvidas que ele acreditava de facto em mim e no que eu lhe ia revelando com verdade sobre as minhas actividades, mormente no tal sindicato dos trabalhadores rurais onde nunca fui secretário, mas apenas e sem qualquer conotação política, a única coisa que tinha feito fora ajudar na escrita em virtude de os dirigentes eleitos serem todos analfabetos. E sim senhor, tinha-me de facto disponibilizado para os ajudar em tudo quanto pudesse mas apenas por uma questão de humanidade, uma vez que, conhecendo cada um deles de toda a minha vida, sabia que tinham a mesmíssima humilde e honrada condição do meu próprio pai.

Desde quando - desabafei - ajudar é crime? E mais! Ao aderirem a um sindicato para defenderem os seus interesses, aqueles honestos trabalhadores não estavam a fazer nada de mal. Porque não haveria eu de os ajudar se tinha todo o meu tempo livre por não conseguir arranjar trabalho desde que regressara da guerra? Não duvido que foi a má fé e malvadez de algumas pessoas que eu inocentemente julgava minhas amigas quem criou à minha volta uma teia de calúnias e falsidades para me denegrirem. Nunca fui militante de nenhum partido político. Mas se o tivesse sido só estaria a usufruir de um direito constitucionalmente reconhecido a todo e qualquer cidadão.

Naquela tarde soalheira de outono enquanto percorríamos calmamente o nosso giro de patrulha com oito horas de duração, contei-lhe ainda sem qualquer receio aquela que foi para mim a melhor medida que o “tal” meu amigo doutor da alfândega - Teixeira Alves - tinha "trazido" de Lisboa para dezenas de velhotes da minha freguesia. Fora publicada em Diário da República uma nova lei que ia obrigar todas as entidades patronais a inscreverem os seus trabalhadores na segurança social a fim de descontarem para as suas reformas e usufruírem dos abonos de família dos filhos menores, aqueles que ainda os tivessem. E essa lei continha também uma cláusula extraordinariamente importante que dizia, mais coisa menos coisa, algo assim:

Qualquer indivíduo que tivesse trabalhado mais de cinco anos para uma entidade patronal e de onde tivesse saído por motivo de velhice há menos de cinco anos, teria direito de ser ainda por lá reformado, bastando para tanto preencher uns formulários que se iam buscar à Caixa de Previdência de Portalegre - hoje designada Segurança Social - sita à data na Avenida Frei Amador Arrais, arranjar a seguir três testemunhas com mais de 21 anos que atestassem por sua honra terem conhecimento que aquele indivíduo trabalhara para a tal entidade patronal durante mais de cinco anos, e, automaticamente, essa entidade patronal seria obrigada a reembolsar a Caixa de Previdência dos descontos retroactivos, podendo logo a seguir o trabalhador que tivesse mais de 65 anos de idade requerer a sua reforma, bastando para tanto preencher um requerimento em impresso próprio.

Não sei dizer que Lei foi aquela. É de finais de 1974, princípios de 1975. Deduzo que terá sido a “mãe” da Lei que tornou obrigatórios os descontos para a Segurança Social de todo e qualquer trabalhador e que por essa altura entrou definitivamente em vigor. Não tenho qualquer dúvida em afirmar que sei, com absoluta certeza, que foi esse o “grave crime” que eu cometi à luz do entendimento mal-intencionado de algumas pessoas que tiveram que abrir os cordões à bolsa para que trabalhadores que as serviram uma vida inteira, alguns durante mais de 60 anos – sim, sessenta anos de dedicação ao mesmo patrão – tivessem direito à sua mais que merecida pensão de reforma. 

Logo que a Lei foi publicada no Diário da República e entrou em vigor, o doutor Teixeira Alves “requisitou-me” para fazermos o “levantamento” de quantas pessoas haveria naquelas condições para que as pudéssemos ajudar. Dito e feito. Nem pensei duas vezes. Ajudar a quem faz falta, aprendi no berço. E além disso conhecia os interessados um a um. Sabia onde moravam, sabia mesmo que muitos deles viviam agora apenas do pouco que tinham conseguido amealhar na sua sacrificada vida de trabalho e de uma mísera “reforma da casa do povo” que nem dava quase para a renda, mas, sobretudo, do auxílio dos filhos, aqueles que os tinham por perto.

Contactámo-los um a um. E informámo-los também um a um dos passos necessários. E fomos depois pedir orientação e ajuda a um grande homem da direção da Caixa – de quem não vou citar o nome – que sempre se disponibilizou amavelmente para ajudar fosse no que fosse. A “cor” política dele? Não sei. Nunca soube.  O que sabia era que na Beirã, nos Barretos e por todos os lugarejos em redor havia por certo mais de duas dezenas de idosos que tinham trabalhado em determinado patrão não apenas cinco, mas, muitos deles, mais de cinquenta anos. A sua vida toda. E viviam agora assim, velhos, incapazes e quase sem nada, por falta do apoio a que tinham direito depois de uma vida inteira de trabalho e sacrifício.

Confesso que foi uma das obras que ajudei a levar por diante de que mais me orgulho até hoje. Ciente da tremenda justiça que nela se concretizava, suportei tudo aquilo que quiseram dizer de mim. Se ser comunista é lutar pelo bem-estar de quem nada tem, pois bem, eu sou um grandessíssimo e convicto comunista porque jamais deixarei de fazer o mesmo sempre e cada vez que for necessário.

Qual foi então a "parte" que mais me “incriminou” em todo aquele processo?

Várias. Para não dizer todas.

Primeiro, fui eu que andei de porta em porta a informar os velhotes daquilo a que tinham direito e o que precisavam fazer. Depois fui eu também que fui a Portalegre com o doutor Teixeira Alves no carro dele buscar os formulários necessários e aprender a preenchê-los para depois o ensinar aos interessados. Em seguida fui novamente eu que os preenchi todos porque nenhum idoso sabia ler nem escrever. Mais ainda fui eu que tive que convencer muitas das testemunhas a atestarem por sua honra que tinham visto aqueles idosos a trabalhar naquele patrão durante mais de cinco anos. Para não falar dos medos que tive que ajudar a dissipar porque “era o senhor fulano tal que depois se podia ofender quando soubesse…” ou então porque “o seu filho, irmão ou primo trabalhavam ainda lá e podiam vir a ter problemas.”

Um a um lá consegui convencê-los que hoje era por aqueles mas amanhã seria decerto por eles próprios. E numa atitude de total confiança mostrando-lhes a minha tranquilidade de consciência e ausência de qualquer receio, a primeira assinatura de todos aqueles formulários era a minha. Muitas dessas testemunhas, tenho a certeza, só perderam o receio de assinar depois de verem lá o meu nome escarrapachado logo à cabeça. 

Em consequência do meu sincero empenho, que, volto a repetir, nada, mas absolutamente nada, teve a ver com partidarismos políticos, soube, pouco depois, que todos os formulários entregues tinham sido deferidos, originando à tal entidade patronal ter que pagar à Caixa de Previdência um reembolso na ordem dos seiscentos mil escudos, quantia algo elevada na altura, mas acumulada por serem de facto muitos os seus ex-trabalhadores com o direito reconhecido pela nova Lei.

O meu camarada e velho guarda Alpalhoeiro nem movia as pálpebras de tão absorto e interessado que estava na minha narrativa...

E continuei:

Assim que terminou a fase do reembolso pela entidade patronal demos início à fase de requerer as respectivas pensões de reforma. Como não podia deixar de ser, lá tive que ser eu outra vez a “descalçar a bota” aos velhotes. Orientado sempre pelo tal ilustre senhor e amigo da Caixa de Previdência, preenchi os requerimentos a quem o solicitava. Todo o processo não durou mais de três ou quatro meses. É preciso esclarecer também com todas as letras e inequivocamente que a minha colaboração foi totalmente gratuita e nunca aceitei qualquer forma de pagamento apesar de algumas dessas pessoas insistirem em gratificar-me.

Passadas poucas semanas os requerimentos de reforma de todos os requerentes foram também deferidos sem qualquer entrave e logo a seguir foram informados os interessados dos respectivos montantes de reforma mensal que lhes seria atribuída a partir da data em que tinham completado 65 anos, bem como o valor retroactivo acumulado a receber e que em alguns casos era, naquele tempo e para eles, uma pequenina fortuna. Sessenta contos uns, oitenta contos outros, enfim, conforme era a soma dos meses em retroactividade assim eram os montantes acumulados a haver. Vi muitas lágrimas furtivas de incredulidade em muitos olhos, vi também imensa gratidão em muitos outros, mas, sobretudo, senti uma paz e felicidade interiores muito mais valiosas que todo o dinheiro em questão.

Só não me apercebi das inimizades ocultas que tudo aquilo desencadeou sobre mim porque nunca foram capazes de mostrar o rosto, preferindo, à boa maneira dos cobardes atacar pelas costas e por métodos sujos. E só não me apercebi mesmo de nada porque muito pouco tempo depois fui-me embora para as Minas da Panasqueira – de onde nunca deveria ter saído – afastando-me da Beirã e esquecendo completamente tudo aquilo até ingressar na Guarda quase cinco anos depois.


José Coelho in  Camaradagem - Histórias do Cota
Obs: - Esta narrativa não está publicada no livro

quarta-feira, 26 de setembro de 2018

Também fui mineiro...

Do meu poeta favorito...

Foto by José Coelho

Ontem à tarde um homem das cidades
Falava à porta da estalagem.
Falava comigo também.
Falava da justiça e da luta para haver justiça
E dos operários que sofrem,
E do trabalho constante, e dos que têm fome,
E dos ricos, que só têm costas para isso.
E, olhando para mim, viu-me lágrimas nos olhos
E sorriu com agrado, julgando que eu sentia
O ódio que ele sentia, e a compaixão
Que ele dizia que sentia.

(Mas eu mal o estava ouvindo.
Que me importam a mim os homens
E o que sofrem ou supõem que sofrem?
Sejam como eu — não sofrerão.
Todo o mal do mundo vem de nos importarmos uns com os outros,
Quer para fazer bem, quer para fazer mal.
A nossa alma e o céu e a terra bastam-nos.
Querer mais é perder isto, e ser infeliz.)

Eu no que estava pensando
Quando o amigo de gente falava
(E isso me comoveu até às lágrimas),
Era em como o murmúrio longínquo dos chocalhos
A esse entardecer
Não parecia os sinos duma capela pequenina
A que fossem à missa as flores e os regatos
E as almas simples como a minha.

(Louvado seja Deus que não sou bom,
E tenho o egoísmo natural das flores
E dos rios que seguem o seu caminho
Preocupados sem o saber
Só com florir e ir correndo.
É essa a única missão no Mundo,
Essa — existir claramente,
E saber fazê-lo sem pensar nisso.

E o homem calara-se, olhando o poente.
Mas que tem com o poente quem odeia e ama?


Alberto Caeiro

Se as coisas não mudam...

Foto by Pedro Coelho

"Decidi mudar muita coisa na minha vida e uma dessas mudanças foi o meu comportamento em relação a certas pessoas, a minha forma de as tratar, o meu jeito de falar com elas, e até minha maneira de lhes sorrir.

Decidi não me preocupar tanto com a maldade alheia, levar mais a sério os meus sonhos, objectivos e planos, afastar-me do que me fazia mal, ignorar o que me fazia recuar nas minhas decisões, distanciar-me de amizades interesseiras e sufocantes, rejeitar os elogios de pessoas que sabia nem sequer gostarem de mim, seguir em frente e acreditar que Deus está comigo em qualquer circunstância.

Há situações que nos acontecem e realmente nos tiram o chão, mas nem tudo é para nos derrubar, nem tudo é para nos anular ou destruir. Há coisas que acontecem para nos mudar, para nos fazer crescer, para nos ensinar a olhar a vida de uma forma mais ampla, mais aberta e com mais maturidade, a não esperar tanto dos outros, a não permitir que eles limitem a nossa felicidade. É aí que entra aquela teoria que diz, "se não consegue mudar o mundo, então mude você ".

Experimente praticá-la e vai chegar à conclusão que as pessoas não mudam para lhe serem agradáveis, que nem todas reconhecem os erros que cometem e as suas imperfeições, que não será você que vai fazer alguém pensar diferente e que você apenas pode ser ou fazer diferente neste mundo onde nem todos sabem amar, valorizar ou respeitar o espaço, a vida e os sentimentos dos outros”.


Cecilia Sfalsin

sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Bom fim de semana...

Foto by José Coelho


Quando me amei de verdade


Quando me amei de verdade, compreendi que em qualquer circunstância, eu estava no lugar certo, na hora certa, no momento exato. E então, pude tranquilizar-me. Hoje sei que isso tem um nome: Autoestima.

Quando me amei de verdade, pude perceber que a minha angústia e o meu sofrimento emocional não passam de um sinal de que estou indo contra as minhas verdades. Hoje sei que isso é Autenticidade.

Quando me amei de verdade, parei de desejar que a minha vida fosse diferente e comecei a ver que tudo o que acontece contribui para o meu crescimento. Hoje sei que isso é Amadurecimento.

Quando me amei de verdade, comecei a perceber como é ofensivo tentar forçar alguma situação ou alguém, apenas para realizar aquilo que desejo, mesmo sabendo que não é o momento ou a que pessoa não está preparada, inclusive eu mesmo. Hoje sei que isso é Respeito.

Quando me amei de verdade, comecei a livrar-me de tudo o que não fosse saudável: pessoas, tarefas, tudo e qualquer coisa que me pusesse para baixo. De início a minha razão chamou essa atitude de Egoísmo. Hoje sei que é Amor-próprio.

Quando me amei de verdade, deixei de temer o meu tempo livre e desisti de fazer grandes planos. Hoje faço o que acho certo, o que gosto, quando quero e no meu próprio ritmo. E sei que isso é Simplicidade.

Quando me amei de verdade, desisti de querer sempre ter razão e, com isso, errei  menos muitas vezes. Aprendi que a isso se chama Humildade.

Quando me amei de verdade, desisti de ficar revivendo o passado e de me preocupar com o futuro. Agora mantenho-me no presente que é onde a vida acontece e vivo um dia de cada vez. Isso é Plenitude.

Quando me amei de verdade, percebi que a minha mente pode atormentar-me e decepcionar-me. Mas percebi também que se a colocar ao serviço do meu coração, ela torna-se-à uma grande e valiosa aliada.


Kim e Alison McMillen

quarta-feira, 19 de setembro de 2018

Meu vício de ler...

Foto by Pedro Coelho in 10.03.18

Aprendi a não bater de frente com quem só entende o que lhe convém


Uma das coisas mais desagradáveis que acontecem é sermos mal-entendidos, quando o outro deturpa as nossas palavras ou as nossas atitudes, descontextualizando-as e utilizando-as em proveito próprio, enquanto nos coloca a nós como o vilão da história. A gente acaba até ficando sem saber se fomos nós que não soubemos explicar-nos ou se o outro é que não soube interpretar-nos

Infelizmente, quanto mais tentarmos provar o nosso ponto de vista, quanto mais nos explicarmos, pior ficaremos, porque quem não entende da primeira vez, raramente compreenderá dali em diante.

Quem se faz de tonto e de vítima jamais será capaz de assumir os seus erros, de se responsabilizar pelos seus atos, de se colocar no lugar de alguém. Tentar fazê-lo enxergar para além do seu umbigo é inútil.

Na verdade, devemos ser sempre verdadeiros e claros com toda a gente, pois, assim, quem nos conhece de facto e gosta de nós, não se abalará com as maledicências que alguém tente espalhar sobre a nossa pessoa.

Temos que ter a tranquilidade de que vivemos de acordo com o que somos, sem dissimulações e meias verdades, para que a mentira alheia não nos atinja nunca, tampouco possa ser levada em conta por quem nos é importante.

Eu costumava bater de frente, quando entendiam errado o que eu dizia, quando maldiziam as minhas atitudes. Hoje não perco mais tempo tentando provar nada a ninguém, de jeito nenhum. O meu tempo é demasiado precioso e resolvi aproveitá-lo para fazer o que gosto, junto de quem me faz bem.

Hoje tenho a certeza de que muitas pessoas só entendem aquilo que querem e da maneira que melhor lhes convém.

Não importa o que eu diga ou o que eu faça, muitas pessoas somente interpretarão a minha vida de acordo com o nível de entendimento delas mesmas, para que possam justificar-se através dos erros que transferem ao mundo – segundo elas pensam, elas nunca erram. Não tenho muito tempo livre, portanto, não gastarei mais energia com quem não merece.


Marcel Camargo
(adaptado ao português de Portugal)

A Beirã velhinha, o "coração" da aldeia...

Foto by José Coelho

domingo, 16 de setembro de 2018

Nasci e moro neste lugar encantado. A Beirã...

Foto by Maria Manuela Coelho

Meu vício de ler...

A minha foto preferida, obra do meu Pedro e retocada por mim


Despedir-nos da nossa mãe é sepultar um pouco de nós.


Despedir-nos da nossa mãe é sepultar um pouco de nós. As despedidas, no geral, maltratam-nos. E o que dizer sobre despedir-se da mãe?

Este tema é tão desolador, que, ao escrever sobre ele, as lágrimas brotaram imediatamente e olhem que eu e a minha mãe nos despedimos no natal de 2010.

Um dia destes eu dei-me conta de que há quase oito anos eu não pronuncio a palavra “mãe” referindo-me à minha.

E sinto tanta falta disso. Frases simples como “bênção, mãe” ou “mãe, viste fulando? Agora isso não faz mais parte da minha vida.

Tanta coisa para ser dita e tanta coisa que eu gostaria de ouvir dela. Mas saio de mim e vou para o geral. Quando perdemos a nossa mãe, tanta coisa se agiganta dentro de nós.

Fica um grito preso na garganta e uma louca vontade de voltar no tempo. O arrependimento também se torna uma visita constante e incomoda. Arrependemo-nos por não ter tido mais paciência em determinados momentos!

Arrependemo-nos de não ter demorado mais tempo dentro do abraço dela cada vez que isso acontecia e por não termos dito com mais frequência o quanto a amávamos.

Por que deixamos passar tantas oportunidades de acariciar aquele rosto tão querido? Por que nunca dissemos que, apesar das marcas do tempo, ela era muito linda? Por que omitimos que tínhamos muito orgulho da guerreira que ela foi? Tantos “porquês, tantos “e se… " tantos “ah, se eu tivesse”.

E assim vamos levando a vida sem o amor que era uma amostra do amor de Deus e nos damos conta de que, aqui na terra, nenhum amor se assemelha ao da nossa mãe.

Uma mãe não ama o filho porque ele é bom, bonito ou inteligente. Ela ama-o porque, ao dar à luz ou ao adotá-lo, esse amor lhe foi apresentado e pronto.

Não importa a idade que tenhamos ou o quão bem-sucedidos sejamos, quando a nossa mãe vai embora, nós nos sentimos sem direcção e com medo. Talvez medo de não conseguirmos caminhar sem aquele amor que era uma certeza para nós. Afinal, a certeza de sermos amados, ainda que por uma única pessoa, imuniza-nos das mazelas desse mundo.

Perder um amor dessa magnitude torna-nos desprotegidos e assustados. Sabes, carinho de mãe é sempre aveludado, por mais ásperas que sejam as suas mãos. O cheiro dela é sempre gostoso, mesmo que ela não use perfume… é cheiro de amor.

Sempre que viajo de avião, por entre as nuvens, eu fantasio que estou bem perto dos meus pais. Eu imagino-os sentados num banquinho a olhar para o horizonte e à minha espera, em frente a uma casinha bem simples.

Na cena, todos os cães e gatos que tivemos um dia estão presentes. Tem também um bule de café e biscoitos. Eu chego e nos abraçamos por muito tempo.


Fonte: Ivonete Rosa (adaptado)

quinta-feira, 13 de setembro de 2018

Meu vício de ler...

Imagem copiada do Google


Melhorar o défice? Cortar no roubo


Para além do envelhecimento populacional e falta de produtividade do país, causada pela má gestão privada e pública das atividades económicas, há uma fatia muito grande do défice que tem uma explicação simples: o roubo.

Quando se discute o défice nas contas públicas nacionais há a tendência para focar dois pontos. Primeiro, qual o montante de défice ideal – uns concordando com as regras europeias, outros achando que tais limites são demasiado apertados. Segundo, qual a forma de atingir um determinado valor para o défice (ou superavit) – uns preferindo cortar nas despesas e manter as receitas; outros preferindo não cortar na despesa, mas aumentar as receitas. Depois, há ainda a discussão sobre que despesas cortar ou que receitas aumentar.

No plano governamental e parlamentar, esta discussão tende a ser muito técnica, ligada às especificidades do Orçamento do Estado e das contas públicas, faltando, muitas vezes, uma discussão mais estrutural.

Não é admissível que Portugal tenha défices nas suas contas públicas desde que se tornou democracia. Não é sustentável uma nação viver em permanente défice (a não ser que se tenha acesso ilimitado ao crédito, como os EUA, porque são a maior potência militar mundial).

Se é verdade que Portugal necessitou de um esforço financeiro grande para sair de uma situação de atraso económico causado pela ditadura tardia a que esteve submetido durante, aproximadamente, 50 anos, muitas das dificuldades financeiras actuais já não encontram aí justificação.

Olhando para o problema de um ponto de vista estrutural, para além do envelhecimento populacional e falta de produtividade do país – causada pela má gestão privada e pública das actividades económicas – há uma fatia muito grande do nosso défice que tem uma explicação simples: o roubo.

Esse roubo tem duas origens:

1. Receitas que não são cobradas – ora por ineficiência do fisco, que tantas vezes deixa prescrever dívidas fiscais; ora por esquemas de corrupção – que permitem a certos agentes eximirem-se às suas obrigações fiscais; ora por leis mal desenhadas – que permitem aos advogados fiscais encontrar caminhos para a impossibilidade prática de os seus clientes pagarem impostos;

2. Despesas desnecessariamente exacerbadas – ora por corrupção, ora por negligência/incompetência dos representantes estatais. São exemplos desses agravamentos na despesa os contratos entre o Estado e os privados, em que os privados ficam com os benefícios garantidos e o Estado com os riscos (vejam-se as PPP rodoviárias, na saúde, ou na exploração energética), ou situações em que o Estado paga muito quando podia pagar pouco (má escolha de fornecedores e prestadores de serviços, avenças e consultadorias inúteis, por cumplicidades impróprias, ou desmazelos na perscrutação de quais os verdadeiros gastos do Estado e a avaliação de alternativas).

Para combater estes roubos, são necessários diversos instrumentos: indivíduos competentes na gestão dos dinheiros públicos, leis mais penalizadoras da corrupção e facilitadoras da acusação desses actos corruptos e entidades fiscalizadoras da gestão do dinheiro público que actuem celeremente – e não passados dez anos, como tantas vezes acontece com o Tribunal de Contas.

O maravilhoso do ataque ao roubo é que dispensa debates ideológicos. Fora aqueles que pensam que roubar o Estado é moralmente correcto, combater a fraude fiscal, a economia paralela e os desperdícios do Estado são acções que conseguiriam pôr Portugal a ter, rapidamente, superavits das contas públicas e, por inerência, a diminuir a dívida.

Depois, podia entrar-se no debate ideológico sobre se devíamos diminuir ou aumentar os impostos, e que impostos, pagar mais ou menos aos funcionários públicos, e com que sistema de incentivos, aumentar ou diminuir as reformas, ou gastar mais ou menos com o SNS.

Uma coisa é certa: não temos economia que sustente tanto roubo, e combatê-lo é a verdadeira reforma estrutural de que Portugal necessita.


Gabriel Leite Mota, Professor Universitário de Economia in JE 13.09.18

quarta-feira, 12 de setembro de 2018

Metade... (do Oswaldo mas também de mim)

Foto by Pedro Coelho


Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio;
Que a morte de tudo em que acredito
Não me tape os ouvidos e a boca; 
Porque metade de mim é o que eu grito,
Mas a outra metade é silêncio...

Que a música que eu ouço ao longe
Seja linda, ainda que triste;
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada 
Mesmo que distante;
Porque metade de mim é partida
Mas a outra metade é saudade...

Que as palavras que eu falo
Não sejam ouvidas como prece
E nem repetidas com fervor,
Apenas respeitadas como a única coisa que resta 
A um homem inundado de sentimentos;
Porque metade de mim é o que ouço
Mas a outra metade é o que calo...

Que essa minha vontade de ir embora
Se transforme na calma e na paz que eu mereço;
E que essa tensão que me corrói por dentro
Seja um dia recompensada;
Porque metade de mim é o que penso 
Mas a outra metade é um vulcão...

Que o medo da solidão se afaste
E que o convívio comigo mesmo
Se torne ao menos suportável;
Que o espelho reflita em meu rosto
Um doce sorriso que me lembro ter dado na infância;
Porque metade de mim é a lembrança do que fui,
A outra metade eu não sei...

Que não seja preciso mais do que uma simples alegria 
para me fazer aquietar o espírito
E que o teu silêncio me fale cada vez mais;
Porque metade de mim é abrigo
Mas a outra metade é cansaço...

Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade para fazê-la florescer;
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção...

E que a minha loucura seja perdoada 
Porque metade de mim é amor
E a outra metade... também.

Oswaldo Montenegro

Figos-chumbos selvagens e doces...

Abundaram sempre por aqui

Um pouco por toda a parte

Desde sempre os saboreei assim descascados

E cá em casa nunca se acaba o seu licor

Uma delícia muito fácil de fazer

O nosso doce de tomate...

Tomates maduros das hortas do Brejo - Castelo de Vide

Pelados, espremidos e migados

Misturamos num tacho igual peso de polme e açúcar 
e vai cozer em  lume médio até fazer ponto alto

Enchem-se os boiões, tapam-se imediatamente e voltam-se
com a tampa para baixo (para esterilizar) até arrefecer