quinta-feira, 17 de dezembro de 2015

Os nosses m´nines jasuses... (em beiranês arcaico e puro)

 
O Menino Jesus da nossa igreja que várias gerações de Beiranenses beijam há mais de 70 anos, desde a Noite de Natal até aos Reis, e que este ano, na Festa da Padroeira, foi generosamente oferecido à Paróquia da Beirã pelas herdeiras da Família Vivas. A foto é da autoria do meu filho Pedro Coelho e foi feita na Missa do Galo de 2012.

O Menino Jesus que a minha Mãe tinha sobre a cómoda do seu quarto, desde o dia que lhe foi oferecido pela nora num Natal distante. Repousa agora todos os dias na prateleira de uma das estantes do escritório cá de casa, junto da moldura que tem o retrato dos meus dois progenitores. Esta foto fui eu que fiz.

Pois é...



domingo, 13 de dezembro de 2015

Bom domingo...


Na convivência, o tempo não importa. Se for um minuto, uma hora, uma vida. O que importa é o que ficou desse minuto, dessa hora, dessa vida. Lembra que o que importa é que tudo o que semeares, colherás. Por isso, marca a tua passagem. Deixa algo de ti, do teu minuto, da tua hora, do teu dia, da tua vida...


Mário Quintana

Do fundo do coração...





quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Coisas que leio...


A6 - Imagem copiada no Google

Segunda-feira passada, a meio da tarde, faço a A-6, em direcção a Espanha e na companhia de uma amiga estrangeira; quarta-feira de manhã, refaço o mesmo percurso, em sentido inverso, rumo a Lisboa. Tanto para lá como para cá, é uma autoestrada luxuosa e fantasma. Em contrapartida, numa breve incursão pela estrada nacional, entre Arraiolos e Borba, vamos encontrar um trânsito cerrado, composto esmagadoramente por camiões de mercadorias espanhóis.
Vinda de um país onde as autoestradas estão sempre cheias, ela está espantada com o que vê:

– É sempre assim, esta auto-estrada?

– Assim, como?

– Deserta, magnífica, sem trânsito?

– É, é sempre assim.

– Todos os dias?

– Todos, menos ao domingo, que sempre tem mais gente.

– Mas, se não há trânsito, porque a fizeram?

– Porque havia dinheiro para gastar dos Fundos Europeus, e porque diziam que o desenvolvimento era isto.

– E têm mais auto-estradas destas?

– Várias e ainda temos outras em construção: só de Lisboa para o Porto vamos ficar com três. Entre S. Paulo e o Rio de Janeiro, por exemplo, não há nenhuma: só uns quilómetros à saída de S. Paulo e outros à chegada ao Rio. Nós vamos ter três entre o Porto e Lisboa: é a aposta no automóvel, na poupança de energia, nos acordos de Quioto, etc., - respondi, rindo-me.

– E, já agora, porque é que a auto-estrada está deserta e a estrada nacional está cheia de camiões?

– Porque assim não pagam portagem.

– E porque são quase todos espanhóis?

– Vêm trazer-nos comida.

– Mas vocês não têm agricultura?

– Não: a Europa paga-nos para não ter. E os nossos agricultores dizem que produzir não é rentável.

– Mas para os espanhóis é?

– Pelos vistos…

Ela ficou a pensar um pouco e voltou à carga:

– Mas porque não investem antes no comboio?

– Investimos, mas não resultou.

– Não resultou, como?

– Houve aí uns experts que gastaram uma fortuna a modernizar a linha Lisboa-Porto com comboios pendulares e tudo, mas não resultou.

– Mas porquê?

– Olha, é assim: a maior parte do tempo, o comboio não ‘pendula’; e, quando ‘pendula’, enjoa de morte. Não há sinal de telemóvel nem Internet, não há restaurante, há apenas um bar infecto e, de facto, o único sinal de ‘modernidade’ foi proibirem de fumar em qualquer espaço do comboio. Por isso, as pessoas preferem ir de carro e a companhia ferroviária do Estado perde centenas de milhões todos os anos.

– E gastaram nisso uma fortuna?

– Gastámos. E a única coisa que se conseguiu foi tirar 25 minutos às três horas e meia que demorava a viagem há cinquenta anos…

– Estás a brincar comigo!

– Não, estou a falar a sério!

– E o que fizeram a esses incompetentes?

– Nada. Ou melhor, agora vão dar-lhes uma nova oportunidade, que é encherem o país de TGV: Porto-Lisboa, Porto-Vigo, Madrid-Lisboa… E ainda há umas ameaças de fazerem outro no Algarve e outro no Centro.

– Mas que tamanho tem Portugal, de cima a baixo?

– Do ponto mais a norte ao ponto mais a sul, 561 km.

Ela ficou a olhar para mim, sem saber se era para acreditar ou não.

– Mas, ao menos, o TGV vai directo de Lisboa ao Porto?

– Não! Pára em várias estações: de cima para baixo e se a memória não me falha, pára em Aveiro, para os compensar por não arrancarmos já com o TGV deles para Salamanca; depois, pára em Coimbra para não ofender o prof. Vital Moreira, que é muito importante lá; a seguir, pára numa aldeia chamada Ota, para os compensar por não terem feito lá o novo aeroporto de Lisboa; depois, pára em Alcochete, a sul de Lisboa, onde ficará o futuro aeroporto; e, finalmente, pára em Lisboa, em duas estações.

– Como: então o TGV vem do Norte, ultrapassa Lisboa pelo sul, e depois volta para trás e entra em Lisboa?

– Isso mesmo.

– E como entra em Lisboa?

– Por uma nova ponte que vão fazer.

– Uma ponte ferroviária?

– E rodoviária também: vai trazer mais uns vinte ou trinta mil carros todos os dias para Lisboa.

– Mas isso é o caos, Lisboa já está congestionada de carros!

– Pois é.

– E, então?

– Então, nada. São os especialistas que decidiram assim.

Ela ficou pensativa outra vez. Manifestamente, o assunto estava a fasciná-la.

– E, desculpa lá, esse TGV para Madrid vai ter passageiros? Se a autoestrada está deserta…

– Não, não vai ter.

– Não vai? Então, vai ser uma ruína!

– Não, é preciso distinguir: para as empresas que o vão construir e para os bancos que o vão capitalizar, vai ser um negócio fantástico! A exploração é que vai ser uma ruína – aliás, já admitida pelo Governo – porque, de facto, nem os especialistas conseguem encontrar passageiros que cheguem para o justificar.

– E quem paga os prejuízos da exploração: as empresas construtoras?

– Naaaão! Quem paga são os contribuintes! Aqui a regra é essa!

– E vocês não despedem o Governo?

– Talvez, mas não serve de muito: quem assinou os acordos para o TGV com Espanha foi a oposição, quando era governo…

– Que país o vosso! Mas qual é o argumento dos governos para fazerem um TGV que já sabem que vai perder dinheiro?

– Dizem que não podemos ficar fora da Rede Europeia de Alta Velocidade.

– O que é isso? Ir em TGV de Lisboa a Helsínquia?

– A Helsínquia, não, porque os países escandinavos não têm TGV.

– Como? Então, os países mais evoluídos da Europa não têm TGV e vocês têm de ter?


- É, dizem que assim entramos mais depressa na modernidade.

Fizemos mais uns quilómetros de deserto rodoviário de luxo, até que ela pareceu lembrar-se de qualquer coisa que tinha ficado para trás:

- E esse novo aeroporto de que falaste, é o quê?

- O novo aeroporto internacional de Lisboa, do lado de lá do rio e a uns 50 quilómetros de Lisboa.

- Mas vocês vão fechar este aeroporto que é um luxo, quase no centro da cidade, e fazer um novo?

- É isso mesmo. Dizem que este está saturado.

- Não me pareceu nada...

- Porque não está: cada vez tem menos voos e só este ano a TAP vai cancelar cerca de 20.000. O que está a crescer são os voos das low-cost, que, aliás, estão a liquidar a TAP.

- Mas, então, porque não fazem como se faz em todo o lado, que é deixar as companhias de linha no aeroporto principal e chutar as low-cost para um pequeno aeroporto de periferia? Não têm nenhum disponível?

- Temos vários. Mas os especialistas dizem que o novo aeroporto vai ser um hub ibérico, fazendo a trasfega de todos os voos da América do Sul para a Europa: um sucesso garantido.

- E tu acreditas nisso?

- Eu acredito em tudo e não acredito em nada. Olha ali ao fundo: sabes o que é aquilo?

- Um lago enorme! Extraordinário!

- Não: é a barragem de Alqueva, a maior da Europa.

- Ena! Deve produzir energia para meio país!

- Praticamente zero.

- A sério? Mas, ao menos, não vos faltará água para beber!

- A água não é potável: já vem contaminada de Espanha.

- Já não sei se estás a gozar comigo ou não, mas, se não serve para beber, serve para regar - ou nem isso?

- Servir, serve, mas vai demorar vinte ou mais anos até instalarem o perímetro de rega, porque, como te disse, aqui acredita-se que a agricultura não tem futuro: antes, porque não havia água; agora, porque há água a mais.

- Estás a dizer-me que fizeram a maior barragem da Europa e não serve para nada?

- Vai servir para regar campos de golfe e urbanizações turísticas, que é o que nós fazemos mais e melhor.

Apesar do sol de frente, impiedoso, ela tirou os óculos escuros e virou-se para me olhar bem de frente:

- Desculpa lá a última pergunta: vocês são doidos ou são ricos?

- Antes, éramos só doidos e fizemos algumas coisas notáveis por esse mundo fora; depois, disseram-nos que afinal éramos ricos e desatámos a fazer todas as asneiras possíveis cá dentro; em breve, voltaremos a ser pobres e enlouqueceremos de vez.

Ela voltou a colocar os óculos de sol e a recostar-se para trás no assento. E suspirou:

- Bem, uma coisa posso dizer: há poucos países tão agradáveis para viajar como Portugal! Olha-me só para esta auto-estrada sem ninguém!

 Miguel Sousa Tavares In Expresso 29-6-2009

sábado, 28 de novembro de 2015

Bom domingo e...

 
... abafem-se, abifem-se, avinhem-se! Diz que a temperatura vai descer 5º.


quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Um exemplo avassalador...



"Vocês não terão o meu ódio

Na noite de sexta-feira vocês acabaram com a vida de um ser excepcional, o amor da minha vida, a mãe do meu filho mas vocês não terão o meu ódio. Eu não sei quem são e não quero sabê-lo, são almas mortas. Se esse Deus pelo qual vocês matam cegamente nos fez à sua imagem, cada bala no corpo da minha mulher terá sido uma ferida no seu coração.
Por isso eu não vos darei a prenda de vos odiar. Vocês procuraram-no mas responder ao ódio com a cólera seria ceder à mesma ignorância que vos fez ser quem são. Querem que eu tenha medo, que olhe para os meus concidadãos com um olhar desconfiado, que eu sacrifique a minha liberdade pela segurança. Perderam. Continuamos a jogar da mesma maneira.
Eu vi-a esta manhã. Finalmente, depois de noites e dias de espera. Ela ainda estava tão bela como quando partiu na noite de sexta-feira, tão bela como quando me apaixonei perdidamente por ela há mais de doze anos. Claro que estou devastado pela dor, concedo-vos esta pequena vitória, mas será de curta duração. Eu sei que ela nos vai acompanhar a cada dia e que nos vamos reencontrar no países das almas livres a que nunca terão acesso.

Nós somos dois, eu e o meu filho, mas somos mais fortes do que todos os exércitos do mundo. Eu não tenho mais tempo a dar-vos, eu quero juntar-me a Melvil que acorda da sua sesta. Ele só tem 17 meses, vai comer como todos os dias, depois vamos brincar como fazemos todos os dias e durante toda a sua vida este rapaz vai fazer-vos a afronta de ser feliz e livre. Porque não, vocês nunca terão o seu ódio."

(Carta aberta que o jornalista Antoine Leiris enviou aos terroristas do EI)

Eu até nem acredito em bruxas, mas...


Desabafos...



Gostaria que alguem me explicasse o significado de democracia, bom senso, sensibilidade e justiça. Na medicina, uma pessoa tem um problema no pé esquerdo e fazem cirurgia ao direito. Na Justiça prende-se o agente de autoridade e o delinquente fica a aguardar julgamento em liberdade. (Depois prescreve). Na política vence a direita, governa a esquerda. Enfim! Vivemos em que planeta? Mas anda tudo doido, ou sou eu, que, com mais de 50 anos, estou a ficar senil? Muito provavelmente sou eu mesmo que estou desactualizado...

A. Rodrigues
(Camarada d'armas e excelentíssimo Amigo)

quarta-feira, 11 de novembro de 2015

Simples e tão fácil de entender...



Penso exactamente o mesmo. E talvez por isso a minha vida tenha sido até hoje tão simples quanto feliz. (Apesar do resto que nem sempre foram só banalidades)...

domingo, 8 de novembro de 2015

Casa cheia. Que delícia...


Foto by Pedro Coelho

A minha pipoquinha Francisca veio mais os papás dela para passarem o fim de semana connosco. 

Linda e radiosa como só ela, conversadora e sempre atenta a tudo o que a rodeia. Só pára mesmo quando o soninho a vence.

Hoje foi com o papá e o vô à mixa. 

A vó teve que ficar a adiantar o almoço e não pôde ir.

- Vais cantar, vô? Eu quero vête...

Sim, meu amor. O vô vai cantar para tu ouvires.

Quando chegou o momento, o papá da pipoquinha, sempre atento a estes pormenores muito de vô e netinha, captou o momento.

E lá está o vô no ambão a cantar o salmo com a netinha na assembleia muito atenta a ouvi-lo...

Eheheh... Quanto não vale ter uma fã assim tão linda?

Doces momentos que nos enchem a alma de ternura e o coração de infinita paz.

Depois...

Bem, depois, ao início da tarde, veio também a pipoquinha Mariana mais os seus papás, para almoçarmos tudis (como diz a Francisca). 

E muito melhor que o arroz de pato ou que o pudim de pão da vó, é podermos estar assim todos juntos, de vez em quando. 

Não há dinheiro que pague uma família unida e bonita como a nossa.

Por essas e por outras, dizia a dona Manuela há bocadinho enquanto jantávamos só já os dois: - Ainda agora a casa estava cheia...

Pois!

São vidas.

Cada um teve que rumar à sua!

Qualquer dia há mais.

Boa semana para todos nós. E já agora, para todos vós também...

sábado, 7 de novembro de 2015

Estórias de roda do lume...



Há dois meses que andamos, todos os dias de segunda a sexta, a caminho do centro de saúde da vila, para tratar uma tendinite do ombro da minha companheira. Chegamos lá sempre por volta das onze e meia e despachamo-nos só depois da uma da tarde. Tardote para o almoço. E às onze horas quando abalamos de casa é demasiado cedo para ele. Hora manhosa mesmo! Mas nestas coisas quem manda, pode... Deixo-a por isso à porta da fisioterapia e vou sempre dar uma volta para entreter o tempo. No dia em que aconteceu a estória que pretendo contar-vos hoje era quarta-feira e fui à farmácia aviar uma receita.

Assim que entrei, vi-a logo. A minha prima-irmã Antonieta com os seus 83 bem conservaditos anos, sentada num canto da farmácia a medir a tensão. Fui dar-lhe o beijinho da praxe porque eu ainda sou do tempo em que os nossos pais nos ensinavam a distinguir dessa maneira a nossa família mais chegada. Pedir a bença aos pais e aos avós dando-lhes um beijo nas costas da mão que eles imediatamente nos estendiam e dar um beijo em cada face dos tios e primos-irmãos porque se uns eram os irmãos dos nossos pais, os outros eram por isso mesmo nossos meio-irmãos. Já agora devo acrescentar que ensinei exactamente o mesmo aos meus filhos e é com um beijo na face que eles cumprimentam toda a família chegada sem qualquer dificuldade ou relutância. Mas voltemos à farmácia Freixedas.

Aviei os medicamentos, a prima pagou o que tinha também ido fazer e saímos os dois em animada cavaqueira porque ela é uma grande e lúcida conversadora. Quem sai aos seus... Convidei-a para irmos tomar café dado que tinha mais de uma hora pela frente e nada para fazer a não ser esperar pela minha lesionada companheira. Chuviscava. A prima ainda não tinha tomado o pequeno almoço e por isso foi só atravessar a rua e instalar-mo-nos confortavelmente numa mesa no interior da pastelaria Sol Nascente. Inevitavelmente a conversa caminhou para as muitas e boas recordações que ambos guardamos dos entes queridos que já partiram. Depois, como era de prever, derivou para os poucos que ainda restamos "daquele tempo", a começar por ela, que está já sozinha no mundo há um bom par de anos.

Os tios Ciro e Maria d'Alegria, seus pais, partiram há mais de duas décadas. De velhice. O seu único irmão, o primo Joaquim, suicidou-se ainda na meia idade, só Deus saberá porquê. O marido, excelente pessoa o Fernando, finou-se de doença maligna. Lisboetas de toda a sua vida, nunca esqueceu as raízes maternas castelovidenses e comprou casa na vila para onde vem passar longos períodos de repouso e sossego, principalmente no verão. Está por isso de abalada para a cidade porque o inverno é muito mais ameno na capital do que na serrana vila. Conversa puxa conversa e perguntou-me de repente se tenho visto o primo Augusto. E desatou a contar-me uma estória que eu não conhecia acerca dele. Estória triste, por sinal. Coisas sobre as quais eu ouvira falar muito pela rama e não entendi muito bem.

Claro que não vou relatar o que me foi contado, por respeito à dignidade e privacidade da vida daquele meu parente próximo. Mas fiquei triste com o que ouvi, pois segundo a prima Antonieta, o Augusto estará "a pagar" pelos erros do passado. Não sei se concordo, mas pronto. Cada um é dono da sua vida e o que cada um faz com ela, é da sua conta e responsabilidade. Quem somos nós por isso, para nos pormos a dar palpites e a fazer considerações acerca daquilo que vai no íntimo de cada um? A Antonieta estava melindrada com o Augusto. Deu para perceber. As razões que lhe assistem também não me convenceram. Tenho o hábito de não tomar o partido só de uma das partes sem conhecer as razões da outra parte também. Acho que toda a gente devia ter esse cuidado. Porque só ouvindo as duas partes se podem tirar algumas conclusões. E muitas vezes nenhuma das partes tem razão.

Tão enleados estávamos na conversa que não demos pelo tempo passar e só o chamado da minha Maria a perguntar onde é que eu estava, nos interrompeu. Pouco depois juntou-se a nós e por ser já tarde decidimos almoçar pela vila naquele dia. Convidámos a prima a fazer-nos companhia. Não quis. Até porque tinha acabado de tomar um copo de leite e uma sandes de fiambre. Provavelmente já nem iria almoçar, disse-nos. Saíamos da pastelaria exactamente quando o primo Augusto chegava à porta da mesma. Quase cego, um ar abatido e muito velhinho para os seus 73 anos. Viu-me e conheceu-me logo. Dei-lhe um abraço, como lhe dou sempre que o encontro. Vinha chateadíssimo: - Porra Zé, já fiz merda! Desabafou. - Então? Que te aconteceu? Perguntei. - Tratei mal a rapariga do Centro de Dia e ela não merecia. Se tivesse ali uma pistola dava um tiro na minha cabeça, porra...

Acalmei-o como pude. A Manuela deu-lhe o beijinho do costume e acalmou-o também. - Vá, esqueça já isso! Especada à porta da pastelaria a equilibrar-se nas suas duas canadianas, a prima Antonieta olhava-nos atentamente. Deve ter pensado com certeza: - Olha! Eles são amigos! Continuava a chover aquele molhaparvos miudinho. O Augusto olhou para a Antonieta. A Antonieta olhou para o Augusto. Ambos pouco à-vontade. De repente a Antonieta perguntou-lhe: - Conheces-me? Sabes quem eu sou? - Sei... Conheço... Respondeu o Augusto pouco entusiasmado. E eu, para ajudar a desanuviar o ambiente, exclamei: Olha Augusto, vamos almoçar ao Djony. Vem connosco! - Já almocei no Centro de Dia Zé. Arroz com frango! Obrigado na mesma. Foi por causa disso que tratei mal a rapariga e agora estou tão chateado comigo mesmo, porra...

Acompanhei-o ao interior da pastelaria. Ao passar pela prima Antonieta ela sussurrou-me: - Paga-lhe lá o café e um bolinho que eu depois dou-te o dinheiro! - Não é preciso, prima, eu pago. Respondi. Ajudei o primo a sentar-se e perguntei ao balcão o que costumava ele beber. - Um carioca e um copo d'água apenas. - Não queres um bolo, uma outra bebida? - Não, obrigado. Agora preciso é de me acalmar! Respondeu. Despedimo-nos. - Até um dia destes. Fomos mesmo almoçar ao Djony nesse dia porque entretanto já passava das duas. Algumas horas mais tarde, telefonema da prima Antonieta. Comovida. Tinha estado toda a tarde a pensar naquele encontro. E acrescentou: - Hoje para mim foi uma tarde memorável! Já pensaste que foi a primeira vez nas nossas vidas que se juntaram estes 3 primos? - É verdade! Não tinha pensado nisso! Três primos irmãos cujo primeiro encontro a três acontece à porta de uma pastelaria. A Antonieta com 83 anos. O Augusto com 73. E o José Manuel com 63... 

Ele há coisas!

A Antonieta nascida, criada e vivida em Lisboa. O Augusto em Luanda e eu na Beirã. Tão longe uns dos outros sempre. Que destino seria este que nos juntou aos 3 naquele lugar, naquele dia? Um encontro improvável de voltar a acontecer, na terra onde nasceu a mãe da Antonieta, a mãe e o pai do Augusto, e o meu saudoso António Maria Coelho. Teriam sido eles, agora que estão lá todos juntos na Terra da Verdade, que mexeram os cordelinhos? 

Sei lá se não... Mas já agora... Obrigado a todos eles!

Bom fim de semana...


Verãozinho de São Martinho. Beirã. 07.11.2015. Meio dia.
Foto by Pedro Coelho

sábado, 31 de outubro de 2015

Desejo-vos um excelente Dia dos Homens (mais conhecido por Dia de Todos os Santos)...


Comam (se puderem) umas broinhas de nóz...
 

...umas castanhitas assadas...
 
 
... e reguem tudo com uma jeropigazita
(de preferência da de Marvão).

terça-feira, 6 de outubro de 2015

Nem tudo o que parece é...


Foto by Pedro Coelho

Já li um cento de "abébias" (vulgo insultos) vociferadas na televisão (e escritas) na comunicação e redes sociais para zurzirem feio e forte quem não foi votar porque assim e porque assado. Pois bem. EU NÃO FUI VOTAR. Pela primeira vez, em 41 anos de democracia e eleições livres, não compareci na minha habitual assembleia de voto na qual estou inscrito desde as primeiras eleições, nos idos de setenta. 

A assembleia de voto da Beirã. 

Residi durante 6 anos em Castelo de Vide, porém, quando havia eleições vinha sempre votar a casa. Sim. A Beirã é a minha única casa desde que nasci. Residi também 8 anos em Nisa. E fiz exatamente o mesmo. Em tempo de eleições era à Beirã que vinha votar apesar de ter sido muito bem recebido e tratado em ambas as terras nas quais vivi por motivo do exercício profissional. Fiel até ao tutano a esta aldeia que me corre no sangue e faz parte de mim.

Mas a vida tem prioridades.

O meu Caçula foi cirurgicamente intervencionado a um sério problema de saúde e nós tivémos que ficar perto dele vários dias porque o amamos. E no dia em que decorreu o ato eleitoral estávamos a 230 km de distância. Não deu por isso para vir votar. Quando se tem um filho a necessitar de nós, queremos lá saber se quem vai governar o país é A, B ou C. Queremos é ficar perto do sangue do nosso sangue enquanto for preciso. E como disse o doutor Pedro Passos Coelho certa vez, "que se lixem as eleições". Foi exatamente o que pensei e fiz.

E não votei. Ou melhor, nós (eu e a mãe do nosso filho Caçula) não votámos, porque deliberadamente entendemos que a nossa condição de pais é muito mais importante do que a nossa condição de cidadãos deste país. E estivémo-nos literalmente nas tintas para tal obrigação. Quantas pessoas como nós não terão ido votar porque não puderam também e por motivos análogos? Muitas. Com toda a certeza. Mas alguém quer saber disso? Qual quê! Metem-nos a todos no mesmo saco. Não fomos votar porque somos menos portugueses do que aqueles que foram votar.

Pois bem... 

Falando apenas e só por mim, quero esclarecer e inequivocamente afirmar com todas as letras que me estou literalmente a cagar para tais opiniões. Não reconheço competência nenhuma a essa gente que vem mandar bitaites porque eu sei o que valho em termos de responsabilidade cívica, honestidade moral, integridade de caráter e de cidadania. Não sou daquelas pessoas que se esconde no anonimato para enxovalhar os outros, dou a cara e assino por baixo SEMPRE. Seja em que circunstância for, seja por que causa for.

Bom seria que muitos desses arautos dos bons costumes se olhassem ao espelho, metessem a mão na consciência e um seixo do tamanho de uma maçã reineta dentro da boca, antes de se porem a dar palpites sobre aquilo que desconhecem. É que, muitas vezes, nem tudo o que parece é...