Aos 07 de Março de 2015 nasce este blogue que tal como o seu antecessor TocadosCoelhos pretende apenas ser um ponto de encontro e de entretenimento pautando-se sempre pelas regras da isenção, da boa educação e do civismo em geral. Sejam bem-vindos.
sexta-feira, 20 de dezembro de 2019
quinta-feira, 19 de dezembro de 2019
sexta-feira, 13 de dezembro de 2019
sexta-feira, 29 de novembro de 2019
Amanhã fico triste, hoje não...
A acolitar o Padre Caetano no casamento do senhor amigo, referido neste texto.
Estávamos
em 1958 quando comecei a servir como acólito (ou sacristão) na igreja de Nossa
Senhora do Carmo da Beirã. Era pároco recentemente ordenado, o reverendo
Joaquim Caetano – hoje de avançada idade mas ainda completamente lúcido a
residir já no Lar para Sacerdotes do Seminário de Portalegre – e foi ele que me
escolheu para substituir o António Sarzedas que chegado a meio moço não queria
continuar. Para além dos meus pais, aquele reverendo sacerdote ensinou-me
coisas e transmitiu-me valores tais que também a ele fiquei a dever muito do
que fui pela vida fora quer como homem quer na formação do meu carácter e
integridade. Por isso guardo até hoje uma amizade, um respeito e uma
consideração sem limites, por ele.
Voltemos
um bocadinho atrás no tempo. Contava muitas vezes a minha falecida Mãe que
desde mui tenra idade, com 2 ou 3 anos apenas, eu desatava a correr rua abaixo
mal ouvia repicar os sinos da igreja:
- Zéi,
mas onde on’dé q’tu vas a correr tanto? Anda ma'sé p’ráqui antes que leves
alguma nalgada…
- Ia à
"misha", Mãe. Ia à "misha"…
Tinha que
ser assim. Tudo indica que o meu fascínio pelo divino começou logo na inocência
da mais tenra idade.
Veio
então, dois ou três anos depois, o convite para acólito do padre Caetano que me
tratava quase como a um filho. E porque os meus pais não tinham posses para me
comprarem roupas novas, era ele quem comprava os tecidos e mandava fazer as
minhas vestes domingueiras às costureiras que naquele tempo abundavam na
aldeia, para o acolitar devidamente aprumadinho com calções ou calças de
terilene, camisas de popeline, casacas e blusões. Até os sapatos domingueiros
me trazia também da fábrica Ebro de Santo António das Areias, pois por norma eu
andava de pés descalços durante a semana e para os domingos só tinha umas sapatilhas
de contrabando, de fraco pano e muito fatelas.
Não
haverá já por cá muita gente que se recorde destas coisas e as que houver se
calhar não irão ler as minhas memórias porque ou já serão bastante idosas ou
nem saberão ler. A propósito desta narrativa, aconteceu uma coisa curiosa no
final da primeira Missa Vespertina da nossa paróquia. Saíamos da igreja eu e o
novo Pároco quando apareceu um antigo e respeitável amigo - o Senhor Nicau -
que fazia anos nesse dia. E entre outras coisas que conversou com o Senhor
Padre Marcelino, disse-lhe também:
- Aqui o
“nosso” Zé Manel foi o sacristão do Padre Caetano no meu casamento. Está lá nas
fotografias! Ora se eu faço hoje 77 anos, veja lá o senhor padre há quantos
anos isso foi…
Saíamos,
escrevi eu, da primeira missa vespertina da Paróquia da Beirã. E fui
propositadamente buscar algumas das minhas memórias para utilizar em jeito de
introdução àquilo que vou escrever a seguir.
Sucedeu
nesse dia o que há muito se previa mas sempre acreditámos demoraria ainda algum
tempo a acontecer. Os sinos da igreja da Beirã que desde julho de 1943 tocaram
ininterruptamente todas as manhãs de domingo por cerca das onze horas a
convocar os fiéis para a missa, calaram-se a 10 de Setembro de 2016 para esse
efeito, provavelmente para sempre. Como dizem os Evangelhos “a vinha do Senhor
é grande e os trabalhadores são poucos”. Foram exatamente essas as
circunstâncias que precipitaram e obrigaram a redesenhar o mapa dos
acontecimentos com a inesperada partida para a eternidade do Reverendo Padre
Luís Ribeiro. Tentando manter vivas as comunidades cristãs dentro dos
curtíssimos limites do humanamente possível, a habitual Missa Dominical da
Beirã teve que passar à categoria de Vespertina no final das tardes de sábado.
Foi o melhor que conseguiu planear o novo Pastor que o veio substituir.
Não sendo
nada fácil para ele, o nosso dever é não só acatar a nova realidade como também
ajudá-lo. Pelo meu lado, embora a minha saúde não esteja por aí além muito
famosa já, continuarei a fazer o que sempre fiz desde 1958. Mas fiquei triste.
Inevitavelmente. São já quase incontáveis as perdas. Foram-se os entes
queridos, quase todos os vizinhos e muitos bons amigos. Até os comboios que,
não sendo gente, eram a vida e a alma desta aldeia. Nunca imaginei que amava
sem dar por isso o agudo apito das ruidosas locomotivas pois só o descobri
quando elas deixaram de vir e apitar. No dia 10.09.16 foi-se também a missa
dominical, aquela cujo repicar dos sinos me fazia desatar a correr rua abaixo
há mais de sessenta anos atrás.
Neste
momento a melhor forma de vos dar conta do meu estado de espírito talvez seja
reescrever o poema encontrado na parede de um dos dormitórios para crianças do
campo de extermínio nazi de Auschwitz:
“AMANHÃ
FICO TRISTE… AMANHÃ!
HOJE NÃO…
HOJE FICO ALEGRE!
E TODOS
OS DIAS, POR MAIS AMARGOS QUE SEJAM, EU DIGO:
AMANHÃ
FICO TRISTE, HOJE NÃO…”
José
Coelho
In
Histórias do Cota
(resumido)
quarta-feira, 20 de novembro de 2019
quarta-feira, 13 de novembro de 2019
Meu vício de ler...
Imagem copiada do Google
Desculpe estragar
a festa, mas o Natal não existe
Há uma ideia
generalizada de que o Natal é a comemoração do nascimento de Jesus. Desculpe
estragar a festa, mas Jesus não nasceu no dia 25 de dezembro nem há 2018 anos
atrás. Então vejamos.
No tempo do
Império Romano, havia uma festa dedicada a Saturno (deus grego Cronos/tempo e
da agricultura), denominada de Saturnalia, marcando o solstício de inverno. Era
uma data muito importante para os povos agrícolas, como o caso dos romanos. Uma
festa popular, para agradar os deuses e pedir que o inverno fosse brando e o
Sol retornasse ressuscitado, no início da Primavera, o renascimento da vida. O
culto solar era celebrado nos dias 24 e 25 de Dezembro, data de nascimento da
divindade. Era um período de suspensão do trabalho, de visitar parentes e
amigos, de ser generoso, solidário, de oferecer prendas. Isso lembra o Natal,
não?
No século IV, o
politeísta imperador Constantino converte-se, oficializa o Cristianismo e
nasce, assim, a Igreja Católica. Absorveu e ressignificou práticas pagãs
diversas; neste caso, o festejo pagão da Saturnalia, transformando-o numa
celebração cristã. O Papa Gregório XIII, no século XVI, com a criação do
calendário gregoriano, fez o resto. A partir daí, o nascimento de Cristo (que
não nasceu no dia 25 e ninguém sabe a data exata) começa a ser celebrado pelos
cristãos.
Portanto, o Natal
não existe, pelo menos não da forma como a maioria imagina – o nascimento do
menino Jesus.
Em que se
transformou, hoje, esta antiga data pagã?
Uma cultura do
consumo. Capturada pelo comércio, a data é para vender coisas, na sua grande
maioria supérfluas. Uma agressiva propaganda na televisão, jornais, revistas,
na internet, provoca uma azáfama, planos, listas de compras, centros-comerciais
lotados, lojas abarrotadas de gente, ávidas para comprar. As crianças de hoje,
exageradamente mimadas, exigem e obtêm, um sem número de prendas. Às vezes, são
tantas que não conseguem abri-las todas ou valorizam mais as embalagens do que
os próprios brinquedos.
É a época dos
políticos e governos, maioritariamente corruptos, que passam o ano a roubar e a
esbanjar os impostos e, nesta data, mandam belas mensagens e participam em
jantares junto com os pobres, com os sem abrigo, miseráveis estes que os
próprios políticos e agentes do governo criaram (ou ajudaram a criar) ao
desviar o dinheiro que poderia garantir a comida e o bem-estar deles o ano
todo. É lógico que esta ‘solidariedade’ natalina dos políticos deve ser sempre
acompanhada por uma ampla cobertura da imprensa.
É a época das
pessoas famosas, do jet-set, atores/atrizes, jogadores de futebol, que passam o
ano a ganhar milhões e a sonegar impostos (prejudicando os contribuintes e os
mais pobres), aparecerem na TV em programas ‘beneficentes’ para dar a entender
que são solidários. Ficam sempre bem vistos perante a sociedade.
As autarquias
gastam imenso dinheiro com enfeites de Natal e deixam os desabrigados a dormir
na rua. Por exemplo, Lisboa gasta todos os anos mais de um milhão de euros,
quantia que dava para abrigar/proteger, tirar da rua, definitivamente, todos os
moradores de rua da cidade.
Todos, decisores
políticos ou não, deviam assistir o emocionante filme Cardboard Boxer (2016)
para ter uma ideia da vida miserável destes excluídos da sociedade. Mas há
outros marcantes filmes do género: deixem para lá o já cansativo Sozinho em
Casa (1990), que repete todos os anos, e assistam The Saint of Fort Washington
(1993), Accidental Friendship (2008), The Soloist (2009), Time Out of Mind
(2014), alguns baseados em dramáticos factos reais e todos expondo, de maneira
super realista, a extrema dureza da vida de uma pessoa sem um lar para chamar
de seu e sem um Shelter (2014), um endereço fixo, para mandar uma carta ao Pai
Natal.
O que podemos
fazer então para celebrar o Natal? Simples: é ser (genuinamente) solidário com
os mais necessitados e, seguindo os verdadeiros ensinamentos de Cristo,
respeitar e amar uns aos outros. E, se pensarmos bem, por que é que temos de
esperar pelo Natal para fazermos isso? Ah, e o mais importante de tudo: não
precisamos de dizer a toda a gente e postar no Facebook as fotos da
generosidade. Não se esqueçam da lição de Antoine Saint Exupéry, no
Principezinho: “o essencial é invisível aos olhos”.
Donizete
Rodrigues, Professor de Sociologia, Universidade da Beira Interior, in
Observador.pt - 22.12.2018
terça-feira, 12 de novembro de 2019
Meu vício de ler...
São
demasiado pobres os nossos ricos
A
maior desgraça de uma nação pobre é que, em vez de produzir riqueza, produz
ricos. Mas ricos sem riqueza. Na realidade, melhor seria chamá-los não de ricos
mas de endinheirados. Rico é quem possui meios de produção. Rico é quem gera
dinheiro e dá emprego. Endinheirado é quem simplesmente tem dinheiro. Ou que
pensa que tem. Porque, na realidade, o dinheiro é que o tem a ele.
A
verdade é esta: são demasiado pobres os nossos «ricos». Aquilo que têm, não
detêm. Pior: aquilo que exibem como seu, é propriedade de outros. É produto de
roubo e de negociatas. Não podem, porém, estes nossos endinheirados usufruir em
tranquilidade de tudo quanto roubaram. Vivem na obsessão de poderem ser
roubados. Necessitavam de forças policiais à altura. Mas forças policiais à altura
acabariam por lançá-los a eles próprios na cadeia. Necessitavam de uma ordem
social em que houvesse poucas razões para a criminalidade. Mas se eles
enriqueceram foi graças a essa mesma desordem.
O
maior sonho dos nossos novos-ricos é, afinal, muito pequenito: um carro de
luxo, umas efémeras cintilâncias. Mas a luxuosa viatura não pode sonhar muito,
sacudida pelos buracos das avenidas. O Mercedes e o BMW não podem fazer inteiro
uso dos seus brilhos, ocupados que estão em se esquivar entre chapas, muito convexos
e estradas muito concavas. A existência de estradas boas dependeria de outro
tipo de riqueza. Uma riqueza que servisse a cidade. E a riqueza dos nossos
novos-ricos nasceu de um movimento contrário: do empobrecimento da cidade e da
sociedade.
As
casas de luxo dos nossos falsos ricos são menos para serem habitadas do que
para serem vistas. Fizeram-se para os olhos de quem passa. Mas ao exibirem-se,
assim, cheias de folhos e chibantices, acabam atraindo alheias cobiças. Por
mais guardas que tenham à porta, os nossos pobres-ricos não afastam o receio
das invejas e dos feitiços que essas invejas convocam. O fausto das residências
não os torna imunes. Pobres dos nossos riquinhos!
São
como a cerveja tirada à pressão. São feitos num instante mas a maior parte é só
espuma. O que resta de verdadeiro é mais o copo que o conteúdo. Podiam criar
gado ou vegetais. Mas não. Em vez disso, os nossos endinheirados feitos sob
pressão criam amantes. Mas as amantes (e/ou os amantes) têm um grave
inconveniente: necessitam de ser sustentadas com dispendiosos mimos. O maior
inconveniente é ainda a ausência de garantia do produto. A amante de um pode
ser, amanhã, amante de outro. O coração do criador de amantes não tem sossego:
quem traiu sabe que pode ser traído.
Mia
Couto
quinta-feira, 7 de novembro de 2019
Respeito e solidariedade por quem nos defende...
Foto José Coelho
Toda
a gente sabe que as actividades policiais das forças de segurança nunca param dia
e noite. E quem assegura esse funcionamento 24 sobre 24 horas de 1 de Janeiro a
31 de Dezembro seja Natal, Páscoa, ou fins-de-semana?
Pois
é!
Enquanto
o cidadão comum em Dezembro consoa feliz o seu natalício bacalhau e as filhós no aconchego familiar ou degusta depois na primavera o pascal cabrito assado no forno e
se diverte, outros cidadãos exactamente iguais a eles mas menos comuns nos direitos e deveres, têm, nessas noites e nesses dias, que permanecer nas ruas, estradas,
esquadras e postos, prontos para acorrer a qualquer anormalidade no desempenho da complexa profissão que deles exige disponibilidade total e permanente.
Ah
pois… E coisa… Foram para lá porque
quiseram, são pagos para isso, estão lá porque querem, se não gostam vão-se embora…
É
fácil e corriqueiro tirar tais conclusões que não passam de mera retórica. Difícil é conseguir perceber-se o respeito que merece o desempenho
de tão exigentes e nada fáceis funções. Mais difícil ainda é perceber a intolerância geral perante qualquer
falha, erro, ou omissão cometidos por algum agente da autoridade, deixando de se ter em conta que sob cada farda se encontra um falível Ser Humano - como todos os outros - sujeito a cometer faltas ou omissões, o qual, como qualquer outro, deveria sempre também ser merecedor de humana compreensão.
É para mim sumamente confrangedor verificar frequentemente como alguns marginais capazes de darem um
tiro e matar uma pessoa à queima-roupa para a roubarem depois, facilmente são considerados, com a maior tolerância e leviandade "indivíduos problemáticos com dificuldades de inserção
social” gastando-se milhares de euros do erário público para os “ajudar” a reintegrarem-se, mesmo sabendo-se de antemão que não vai resultar.
Em
contrapartida, um agente da autoridade que precise efectuar um disparo com a
arma lhe está distribuída como ferramenta no desempenho das suas funções e para dela fazer uso no integral cumprimento do seu dever conforme
está transcrito na lei "... em defesa da sua própria integridade
física ou de terceiros, para impedir ou evitar por todos os meios ao
seu alcance o cometimento de crime iminente ou em já em curso..." mas se dela tiver que fazer uso, logo a seguir o seu comportamento é analisado ao pormenor por meio mundo a começar
de cima e imediatamente é crucificado na praça pública, ele sim vítima depois de burocracias absurdas, de conclusões fáceis, cómodas e
popularuchas que o "condenam" porque “excedeu” ou “abusou” da sua
autoridade e competência.
Não
faz sentido! Cá para mim, sinceramente, os valores fundamentais neste nosso
País andam completamente invertidos, ou a ser muito mal interpretados.
E
quando tais coisas acontecem, quem vem dar a cara em defesa do agente da
autoridade?
A
cadeia hierárquica de comando?
Sim! Normalmente para, pública e pomposamente, anunciar que já foi instaurado um processo de averiguações para o cabal apuramento de
responsabilidades.
A
Comunicação Social?
Muito pelo contrário porque, naturalmente, ela precisa da
notícia para vender o produto, e, para o conseguir, todos os meios justificam os fins. Não há deontologia
profissional que valha.
A
Opinião Pública?
Pior um pouco! Se uma voz disser “matem-no” outras cem dirão
em coro “esfolem-no”…
Porque
será que tantos guardas e polícias se têm suicidado ultimamente?
Será porque…
- São devidamente apoiados?
- É uma profissão muito compensadora?
- É fácil?
- Passam a vida de papo para o ar a gozarem os seus chorudos rendimentos
de pouco mais que o ordenado mínimo nacional?
Já fui um deles. Por isso os compreendo tão bem e os defendo publicamente com
unhas e dentes. Eu também errei inadvertidamente algumas vezes. Quem é que
nunca erra? Só
posso garantir com absoluta certeza que nunca agi deliberadamente dessa forma. Nem para
exceder o uso da minha autoridade. Nem para impor a minha vontade. Nem por
simples maldade, arrogância, desleixo ou má fé.
Errei
porque estava… a trabalhar. Errei porque estava… no desempenho das minhas
legais funções nas quais fui, como todos eles, publicamente investido. Porque
estava, decerto também, a cuidar do superior interesse da comunidade ou de
alguém que individualmente necessitava de ajuda. Errei
porque sou humano e como tal imperfeito. Como todos vós que estais
a ler isto neste momento e também todos aqueles que apregoam moralidade mas não
sabem ver-se ao espelho nem sabem pôr a mão na sua própria consciência.
Todos
erramos.
A terminar por hoje, poderia referir a minha extensa folha de serviços
prestada à Causa Pública durante os anos em que a servi, os quais foram hierárquica e publicamente reconhecidos de diversos modos e na qual não
existe a menor mancha nem consta a mais ínfima irregularidade. Antes pelo
contrário. Poderia,
mas não vou referi-la. Apesar de me haver sensibilizado muito o seu reconhecimento por diversas entidades, não me envaideci. Senti sempre que apenas
cumpri com o meu dever no cabal desempenho das obrigações profissionais.
Basta-me a consciência tranquila e a paz de espírito que me proporcionam a mais absoluta serenidade no meu viver de cada dia. Mas continuo a ser e serei sempre, solidário com quem lá continua, 24 sobre 24 horas, 365 dias por ano, a dar o seu melhor pela segurança e tranquilidade de todos nós.
Basta-me a consciência tranquila e a paz de espírito que me proporcionam a mais absoluta serenidade no meu viver de cada dia. Mas continuo a ser e serei sempre, solidário com quem lá continua, 24 sobre 24 horas, 365 dias por ano, a dar o seu melhor pela segurança e tranquilidade de todos nós.
José Coelho
07.11.2019
segunda-feira, 4 de novembro de 2019
No teu dia e onde estiveres, um abraço cheio de saudades, Pai...
António Maria Coelho
05-11-1910 // 23-01-1994
"Desde que chegara a Lisboa, eu
estava muito piegas. As lágrimas assomavam-me aos olhos por tudo e por nada
inexplicavelmente. E acho que nunca mais me curei da pieguice de que nada me
envergonho por ser coisa que herdei do Pai, o qual, muitas vezes e com a maior
facilidade, chorava. Bastava dar-lhe um beijo ou um abraço ou fazer-lhe um
carinho qualquer. Fossem os filhos ou os netos. Penso que por ser pessoa tão
bondosa, comovia-se facilmente e muitas vezes sem qualquer razão aparente.
O elegante comboio azul TER chegou por fim à estação
de Castelo de Vide, a penúltima antes da Beirã. Faltava um quarto para as onze.
A paisagem tão querida e tão familiar começou a desenrolar-se diante dos meus
extasiados olhos. Que delícia! Que saudades eu tivera das minhas pedras, dos
meus sobreiros e giestas, daquele aroma cálido e perfumado dos campos secos do
início do verão, longe do húmido, pegajoso e interminável verde, da floresta
tropical.
Parecia ainda quase um sonho mas ali estava Castelo de
Vide de um lado da linha, e, do outro, os canchais pontilhados de carvalhos,
sobreiros, oliveiras, hortas e casas brancas isoladas, aqui e além. Era
mesmo verdade. Ia no comboio que me levava finalmente para casa, para junto de
todos os entes queridos. Passámos a Ponte das Águas e mais além avistei o
Monte da Broca com a grande e sempre tão bem cuidada horta do Pai.
Ufff…
Ainda hoje me arrepio com essa
recordação!
Logo a seguir o campo da bola e o Penedo
da Rainha. E lá vinha ele quase a correr pela estrada do Pereiro antes da
cancela da passagem de nível. O meu Pai! E a porra da janela do TER que não
abria! O comboio era climatizado por isso as janelas eram de vidros fixos!
Fiz-lhe adeus. Ele viu, conheceu-me e fez-me adeus também. Depois de tanto
tempo. Depois de ter temido tantas vezes não voltar a abraçá-lo.
Poucos minutos depois, especado à porta da
nossa casa, ofegante ainda pela correria desde a horta, aguardava-me com os
olhos marejados de grossas lágrimas.
- Meu querido Pai...
- Até que enfim, filho!
Abraçá-mo-nos um ao outro a chorar parecendo duas madalenas arrependidas como se ainda temêssemos que fosse mentira num inesquecível momento de mútuo carinho que guardarei na memória o resto da minha vida..."
José Coelho
in Histórias do Cota
(excerto)
terça-feira, 29 de outubro de 2019
Só quem semeia, colhe...
Não tenho conseguido tempo
para escrever como gosto, ocupado que ando noutros afazeres. Assim que o outono
"amaciou" e vieram os primeiros pingos de chuva imediatamente meti
mãos à terra para fazer a horta de inverno, a única que posso fazer pois não
tenho poço nem furo no quintal, e, cá neste alto das pedras onde moro na Beirã,
nem merece a pena pensar fazê-los porque seguramente não dariam água senão a
grande profundidade. E mesmo assim, não sei.
Fazer uma horta de verão a regar
da rede pública é de todo impensável quer pela insensatez de esbanjar o
precioso líquido potável quer porque seria incomportável em termos de custo.
Depois, apesar de não ser demasiado grande o quintal, ainda dá bastante
trabalho porque não possuo também nenhum motocultivador e não é pelo seu custo
mas porque prefiro fazer como o meu pai fazia e com tanto empenho me ensinou; cavar
a terra à enxada, embelgar, semear primeiro, transplantar depois, "acarinhar"
continuamente o plantio para eliminar ervas daninhas e precaver pragas.
Além disso adoro mexer na
terra com as mãos para sentir o seu odor bendito, ver as frágeis sementes brotar e transformarem-se
em robustas plantas, entreter-me dias inteiros sem quase dar pelo
correr das horas. Não há nada para mim mais saudável, pacífico e relaxante. Um grande
amigo meu e doutor de leis que comprou uma propriedade por estas redondezas, diz,
com muita convicção que “um dia na quinta é mais relaxante do que uma ida
ao psicólogo”. Concordo. O contacto com a natureza e a paz que naturalmente dela
emana são seguramente mais benfazejos que muitos medicamentos.
Como escreveu uma escritora
que leio amiúde “nasci em tempos rudes” e neles “aprendi a viver”. Não tenho
qualquer dúvida que foi essa rudeza que fez de mim a pessoa que sou porque rudes
eram também as gentes desse tempo. Não uma rudeza que maltratasse, muito
pelo contrário, eram rudes no trato pela aspereza da vida mas no carácter e nos
princípios eram mais puros e cristalinos que os diamantes. São inexplicáveis as
saudades que sinto cada dia e cada vez mais deles e de tudo o resto.
Além de conseguir fartura de
verduras para consumo familiar todo o inverno com a minha hortazinha, as
alfaias agrícolas que herdei do meu pai – enxadas, sachos, forquilhas, ancinhos,
rodos, pás e picaretas entre outros – levam-me sem qualquer esforço mental até
junto dele quase sempre. Tento imitar o seu modo de fazer, a perfeição do seu
trabalho, os toques e retoques para que cada rego ficasse perfeito, retilíneo
como feito à régua e esquadro, o modo de plantar, de cuidar, de amanhar
tudo, tratando as plantas com o mesmo cuidado e esmero com que sempre tratava
as pessoas e os animais, no ingénuo carinho e doce trato que tanto o
caracterizavam, fazendo com que toda a gente o estimasse e respeitasse também.
Não é a primeira vez que
escrevo isto, mas vou escrevê-lo de novo sem qualquer pudor. A sua presença na
minha saudade é tão forte que muitas vezes me parece sentir no quintal e perto de mim o seu odor,
do tabaco de onça e mortalha que sempre o acompanhavam e nunca lhe fizeram mal
já que até o vício de fumar dele era também diferente de todos os outros que eu
conhecia. Não aspirava o fumo para dentro dos pulmões. Limitava-se a queimar o
cigarro entre os lábios e a saboreá-lo apenas na boca. Assim viveu tranquilamente comigo
até aos 83 anos e foi um tumor na próstata que o venceu.
Suponho que três quartos do
meu ADN são dele – até a minha cara hoje é quase uma cópia fiel da sua – e só
um quarto é da minha mãe, apesar de também ter sido abençoado com o seu incondicional
e profundo amor desde que nasci, até que a perdi. Nunca na minha vida por isso me
senti pobre ou carente. O dinheiro sempre foi à conta, algumas vezes a esticar
mais que a conta, mas acabou sempre, mais sacrifício, menos esticadela, por
chegar. De afectos porém, de amor fraterno, de educação, de respeito e honradez,
na nossa casa e família fomos sempre milionários.
Tento, desde que comecei a
ser responsável, imitar os meus queridos progenitores e competentes mestres em
tudo o que me foi por eles ensinado. Dando como eles o exemplo. Creio
que consegui pois os meus filhos e a vida que fazem são indubitavelmente a minha maior felicidade e orgulho. Nem sequer me incomoda nada o facto de
nenhum deles ter aprendido o que o pai aprendeu com o avô. A cavar a terra, a semear e plantar nabiças ou couves. Cada geração tem a sua particularidade e
nenhuma é melhor ou pior que a anterior, assim como as vindouras não o serão em
relação à actual.
Mudam-se os tempos mudam-se
as vontades. Mas há uma coisa que nunca mudará venham os tempos que vierem. Quem
quiser colher terá que saber semear. Na horta ou na vida.
José Coelho
29.10.2019
segunda-feira, 21 de outubro de 2019
Dia ganho...
Foto José Coelho
Abrantes,
dezanove de outubro deste Ano da Graça de dois mil e dezanove numa jornada
de formação para revalidar o mandato trianual pessoal e intransmissível que visa
apoiar em duas tarefas específicas quando e se necessário os Párocos que nos indicaram
para esse efeito ao Senhor Bispo. De três em três anos lá vamos nós, um punhado
de paroquianos oriundos de todos os pontos da Diocese de Portalegre – Castelo
Branco, repartidos por três grupos em três dias, três datas e três pontos de
encontro.
Desde
2001 que frequento esta e outras formações que muito têm enriquecido os meus
conhecimentos sobre a Igreja e aprofundado a minha fé. Algumas no Seminário de
Portalegre, outras na Casa de Mem Soares – Castelo de Vide, outras no Seminário
de Alcains, também na Sertã e este ano em Abrantes. Para além da imprescindível
preparação são também dias de fraterno convívio e partilha entre participantes. A parte da manhã é dedicada especificamente ao tema que ali nos reúne e após o almoço são formados diversos grupos para debate e partilha das
experiências de cada um no desempenho das funções.
Cada participante revela as dificuldades com que se deparou e como as resolveu tendo em conta
que naqueles momentos não havia por perto nenhuma entidade a quem se pudesse pedir
apoio. Parecendo à partida uma tarefa muito simples não o é, requer não só conhecimentos como também elevada sensibilidade pela sua delicadeza e intrínseco valor. E há ainda que ter em conta a debilidade física das pessoas a quem
normalmente é levada. Temos sempre algo novo a aprender assim como temos sempre
algo para repartir. Ninguém sabe tudo, ninguém faz mais ou melhor
que ninguém e a humildade é comum a todos.
Este
ano, depois de mais uma manhã de formação e reflexão conjuntas, coube-me
fazer parte de um grupo com participantes de Nisa, Vila Velha de Ródão,
Abrantes e Arronches. Cada um de nós fez a sua apresentação pessoal completa e
referiu a paróquia a que pertencia bem como as tarefas que normalmente
desempenha na mesma em prol da comunidade e a sua convicção no desempenho das
mesmas. Falar de nós para um grupo de pessoas que não conhecemos de lado nenhum
não é fácil no princípio mas sucede quase sempre gerar-se nestas palestras uma
empatia tal que sem nos darmos conta estamos em pouco tempo todos a conversar como
se nos conhecêssemos de sempre.
De
tal modo assim sucedeu na passada segunda-feira que houve ocasião até de
repartirmos uns com os outros alguns problemas pessoais e familiares que embora
nada tendo a ver com o desempenho da missão que ali nos reuniu acabou por
despertar o interesse comum já que uma das pessoas que pôs sobre a mesa o seu problema estava bastante fragilizada. Não sei o que se passou no íntimo de cada
uma das outras pessoas do grupo à volta da mesa mas no meu gerou-se imediatamente uma incontível vontade de fazer alguma coisa que suavizasse um pouco aquele visível sofrimento.
Ouvi
sem interromper até que o desabafo terminou. E perante o profundo silêncio que
se instalou na sala quando a pessoa se calou, pedi licença para dizer também de minha justiça e relatei à mesa algumas peripécias iguais ou parecidas que me sucederam ao longo da vida assim como o quanto me tinham causado dúvidas
existências semelhantes às que acabara de ouvir. Sugeri-lhe que não baixasse
os braços, pois foi o que eu fiz. E que jamais deixasse de acreditar ou de lutar
pelas suas convicções. Parafraseando algo que li algures disse-lhe ainda que “perder
uma batalha não implica perder uma guerra”, muito menos quando sabemos que a
razão está do nosso lado. E
rematei:
- Em vez de desistir, de ficar sentado a chorar à beira do caminho com muita pena de mim mesmo, levantei-me decidido a enfrentar todos os obstáculos. E um a um os venci. Olhando hoje para trás quase me parece um sonho mas posso dizer bem alto: Consegui! E verá como a senhora vai conseguir também.
- Em vez de desistir, de ficar sentado a chorar à beira do caminho com muita pena de mim mesmo, levantei-me decidido a enfrentar todos os obstáculos. E um a um os venci. Olhando hoje para trás quase me parece um sonho mas posso dizer bem alto: Consegui! E verá como a senhora vai conseguir também.
O
tempo para reflexão dos diversos grupos havia entretanto terminado e chamaram-nos
para o encerramento da formação na biblioteca onde cada grupo apresentou as
dúvidas que haviam surgido, para, na medida do possível, serem dadas indicações
de como as resolver no futuro. No nosso grupo nada havia para esclarecer e
ficámos por isso todos em silêncio a ouvir os outros. A última actividade do dia
foi a participação na Eucaristia celebrada na capela existente no edifício onde nos encontrávamos.
Algumas das pessoas, por serem de perto, quiseram saír para irem tomar parte nas Eucaristias das suas comunidades, ficando ali apenas os participantes de mais longe como nós, de Marvão.
Preparava-me
para descer as escadas para a capela no rés-do-chão quando fui interpelado pela
senhora que havia desfiado a sua amargura na palestra de grupo dessa tarde e me quis dizer diante de todos os presentes:
-
Obrigado, José. Dê cá um beijinho. Não sabe o bem que me fizeram as suas
palavras…
Voltaremos
a ver-nos? Provavelmente não! Apesar desta formação se realizar em cada triénio os grupos são numerosos, os locais diversos e distantes uns dos outros, por isso raramente se juntam os mesmos participantes. Não pretendo de modo nenhum desvalorizar a importância da formação que frequentei mas, honestamente, este resultado valeu para mim muito mais do que todo o resto daquele dia que inesperadamente ganhei.
José
Coelho
21.10.19
E por vezes...
Luanda - Casa de Fados "O Campino", 10 de Março de 1972
E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes
encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes
ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos
E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos
David Mourão - Ferreira
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes
encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes
ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos
E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se evolam tantos anos
David Mourão - Ferreira
terça-feira, 15 de outubro de 2019
Nada de equívocos hein?...
Foto Pedro Coelho - Beirã, 10-03-18
Era
aquele Senhor Guarda um beirão dos sete costados, oriundo de uma aldeia muito
conhecida das cercanias de Monsanto, na Beira Baixa. Tendo sido colocado no
Algarve muitíssimo longe de casa e da sua família quando terminou o
alistamento e porque naquele tempo mudar do batalhão do
Alentejo para o batalhão das Beiras demorava sempre uma boa
dúzia de anos, muitos desses “ratinhos” optavam por pedir transferência dos postos mais a sul para outros postos do mesmo batalhão mais a norte como era o caso do posto de Nisa, por fazer “fronteira” com a Beira Baixa.
Por isso os efectivos daquele posto, na
sua esmagadora maioria, eram militares oriundos das cercanias beirãs. Castelo
Branco, Cebolais, Idanha-a-Nova, Monsanto, Sertã, Covilhã, Fundão, Vila Velha
de Ródão, ou de muitas outras localidades vizinhas. E por ali permaneciam o tempo
necessário até serem finalmente transferidos de batalhão e colocados mais perto
das suas terras de origem. Casos houve em que alguns desses beirões acabaram por
se estabelecer. Ou porque trouxeram a família compraram casa e criaram raízes, ou por serem solteiros, conhecerem,
namorarem e acabarem por casar com raparigas de Nisa e arredores, fundando por ali a sua nova família e optando por ficarem definitivamente no Alentejo.
Não era porém o caso deste militar a que me refiro hoje. Mas era de facto uma pessoa excelente. Bom camarada, de uma educação exemplar,
muitíssimo atento aos seus deveres e nunca se escusando em caso algum a tomar
conta de um serviço, por mais bicudo que pudesse ser. E
era também um tudo-nada gago de nascença. Em situações tranquilas quase nem se
dava por isso. Mas se o faziam irritar ficava tão excitado que inconscientemente gaguejava mais.
Como
humanos que somos e com inúmeros defeitos que temos, gostamos por vezes de nos rir à custa dos
outros. Por isso os camaradas o faziam algumas vezes zangar deliberadamente. Fosse por o Benfica ter perdido um jogo e ele ser benfiquista ferrenho, fosse por outro motivo
qualquer, daqui que dali lá o ouvia eu a estrebuchar fulo sem conseguir
expressar-se tão rapidamente como desejava nos seus irados desabafos.
Certo
dia foi o dito cujo militar requisitado pelo tribunal local para depor no
julgamento de um crime de desobediência em que ele e outro camarada tinham
sido intervenientes. O militar mais antigo fora o participante e ele era a
testemunha. Nada de grave nem de transcendente. Apenas um daqueles processos
vulgaríssimos em que a patrulha detectava algo errado e dava uma ordem legal
mas que não era obedecida, o que levava, nesse tempo, à imediata constituição de
arguido do desobediente depois de lhe ter sido correctamente
explicitado que se persistisse na sua atitude estaria a incorrer num crime
previsto e punido por Lei.
Naturalmente, depois da asneira feita, o desobediente quando se via “entalado” num
processo-crime, tratava logo de arranjar um advogado para o defender e
representar. E foi o que aconteceu neste caso também. Ao
longo da minha carreira profissional tive alguns “embates” com esses
excelentíssimos profissionais mas ficámos amigos na mesma porquanto sempre entendi que dentro da sala de audiências eu representava a minha parte de acusar e provar o ilícito criminal que me tinha levado a deter o arguido,
enquanto os senhores doutores advogados cumpriam a parte que lhes competia e
para a qual eram contratados de tentarem atenuar o dolo ou culpa dos seus
clientes usando de todas as estratégias legais para conseguirem a sua absolvição ou pelo menos uma pena mais leve.
Sem
qualquer intento de vangloriar-me mas apenas com profissional satisfação,
posso ainda hoje afirmar que nos muitos processos judiciais e consequentes
audiências de julgamento em que fui interveniente como participante, nenhum
detido por mim foi absolvido alguma vez. Quer isso dizer apenas que só apresentei em tribunal os casos em que não tive qualquer dúvida do ilícito
criminal cometido, pois que, na dúvida, nunca avancei para esse procedimento
Talvez
por isso mesmo sempre senti da parte dos meritíssimos juízes e também dos
excelentíssimos advogados a grata consideração de raramente porem em causa a licitude
das minhas actuações enquanto Órgão de Polícia Criminal. E
era nesse sentido que instruía e orientava também os meus subordinados. Na
dúvida, não se fazer nada. Se dúvidas houvesse quanto à licitude de um
procedimento ou se não fosse imediatamente deduzível o ilícito criminal, essas dúvidas tinham sempre que reverter a favor do suspeito. Em processo penal mais
vale pecar por defeito do que por excesso porque o defeito pode não ser condenável
mas o excesso pode configurar imediatamente o crime de abuso de autoridade e não só.
Não foi o caso do julgamento que aqui estou a relatar hoje. A patrulha tinha agido
em conformidade. Porém e muito naturalmente, durante o decorrer da audiência de
julgamento o senhor doutor advogado de defesa do arguido interrogou os guardas
com aparente animosidade. Actuação normalíssima e própria do calor do debate. Até que, a
dado momento, interpelou a única testemunha, o nosso militar meio-gago, com algumas
perguntas acutilantes, conseguindo enervá-lo.
Em consequência desse nervosismo,
começou o digníssimo Guarda a gaguejar inadvertidamente com maior evidência.
Provavelmente por pensar tê-lo atrapalhado porque isso convinha aos seus
interesses, o senhor doutor insistiu um pouco mais elevando significativamente o tom
da voz. Foi quando, já manifestamente irritado, o nosso militar pediu respeitosamente
licença ao senhor doutor juiz para se dirigir frontalmente ao senhor doutor
advogado, dizendo-lhe na sua mais que justa e irada gaguez:
-
Ó-ó se-se-nh-nhor do-dou-to-tor a-ad-advogado!
O-o-olhe q-q-que e-e-eu n-nã-não t-t-tou a-at-atra-pa-pa-lhado, ne-ne-nem com-com
me-me-medo d-de ssss-ssss-si. Sss-sou-sou, é-é-é ga-ga-go, de-de-de na-na-nas-nascença!...
Não
vos digo, nem vos conto! Quando horas mais tarde no final do julgamento isto foi relatado no posto, chorámos
de tanto rir! E,
muito convicto da justeza da sua valente atitude, o nosso digníssimo camarada retorquia ainda mais convictamente:
-
O-o-o g-ga-ga-jo jj-ju-julgava qq-queu tt-ta-tava co-co-com mm-me-medo d-de-dele…
Não
há muito tempo ainda encontrá-mo-nos no Jumbo de Castelo Branco. Ele
acompanhado pela sua mulher e filhos e eu já só com a minha mulher. Ao reconhecer-nos
dirigiu-se-nos de imediato para nos cumprimentar, e para, em seguida, irmos
todos juntos tomar um café, enquanto recordávamos alegremente esses bons tempos já algo distantes mas fundadores destas recordações tão saborosas, bem como de uma sã amizade para a vida toda…
José
Coelho
In
Historias do Cota
sexta-feira, 11 de outubro de 2019
Beirã - Preciosidades com 76 anos...
Nossa Senhora do Carmo salvando almas do Purgatório
Painel de azulejos no hall de entrada direito da Igreja da Beirã
Nossa Senhora do Carmo a entregar o Santo Escapulário a S. Simão Stock
Painel de azulejos do hall de entrada esquerdo da Igreja da Beirã
Fotos - Maria Coelho - 09.10.2019
Meu vício de ler (***) ...
Imagem copiada do Google
Deixa…
“Eh, pá, deixa. Deixa estar o que não podes mudar. Deixa ficar o que não
podes levar. Deixa para trás o que não te deixa ir em frente. Deixa ir quem não
te deixa seguir. Deixa ir quem te deixou ir.
Deixa de crer nas pessoas que não te querem. Deixa de querer que te queiram.
Deixa de pensar em deixar e deixa mesmo. Deixa de querer fazer tudo, deixa de
fazer tudo o que querem. Deixa. Deixa-te disso. Só de ti nunca. Nunca te deixes
de lado. Nunca te deixes ir onde não és tu. Nunca te deixes levar por coisas
que não levam a lado nenhum. Não deixes de gostar de ti. Não deixes de
aprender. Deixa acontecer a felicidade. Não vivas para deixar nada a não ser
saudades e o exemplo de quem não deixou que lhe roubassem a alegria. A vida é a
tua deixa. O resto, eh, pá, deixa ficar.”
In Lado.a.lado - 06.08.2019
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