A minha fotografia é aqui colocada deliberadamente a "dar a cara" pelo que vou escrever e assinar, acerca daquilo que penso e sinto, porque nunca me escondi sob pseudónimos ou outras formas de conveniente anonimato, assinando sempre por baixo tudo o que é da minha autoria e inteira responsabilidade.
Para que conste.
Para que conste.
A minha Beirã sempre foi uma aldeia linda e cheia de vida, trabalho e futuro, para centenas de pessoas, de onde ninguém precisava migrar ou emigrar, porque aqui e em tudo à volta havia trabalho para todos.
Nasci nesta aldeia, freguesia e concelho. E cá moro setenta e um anos depois. Mas quem me dera não morar. Porque é bem certo aquele ditado que diz "penas que não se vêem, não se sentem". Ver morrer a nossa terra antes de nós, é algo impensável e contranatura.
Fui tão feliz aqui no meio da maior simplicidade, tão mais feliz do que sou hoje.
A Beirã era maioritariamente rural porque 60% das pessoas eram camponeses. Porém, ironia do catano, éramos tão mais alegres! Qualquer gaiato assim que saía da escola com a 4ª classe feita, no dia seguinte, como aconteceu comigo, ia trabalhar para ajudar nas despesas da casa.
Hoje numa democracia tão gabada que cada vez entendo menos por ver esquecidos todos os valores que aprendi na ditadura, ensinados pelos meus pais e avós apesar de analfabetos, os filhos são dependentes dos pais até aos 30 anos para acabarem os cursos superiores.
E mais.
Proibiu-se um miúdo de trabalhar enquanto menor por ter de fazer a escolaridade obrigatória e continuar depois os estudos para engenheiro ou doutor e assim passar 30 anos a expensas dos pais, mas que, depois de um montão de dinheiro por eles gasto, o licenciado não faz nem ideia onde irá aplicar a engenheirice ou doutorice, a não ser que tenha algum padrinho, preferencialmente da política.
Mais ainda.
Quando era um jovem havia tantos perigos à espreita em todas as esquinas - eu nunca os vi - que não se podia falar ou escrever tudo o que a gente pensava como eu estou a fazer neste momento porque podia ser preso. Mas havia respeito, educação, honestidade, princípios e valores que pretensamente em nome da liberdade conquistada foram convenientemente passando de moda.
E deram lugar a esta nova forma de convivência em sociedade na qual para se ter sucesso é necessário fazer uso de malabarismos como a corrupção, o compadrio, o oportunismo, a falta de ética, a desonestidade, a falsidade e muitos outros argumentos sujos que encheriam várias páginas se eu quisesse descrevê-los todos.
Os alunos respeitavam os professores e os pais confiavam neles. Hoje os alunos batem nos professores e os pais movem-lhes processos por danos morais se ousarem proibir algum menino de, por exemplo, brincar com o telemóvel numa aula.
Os alunos respeitavam os professores e os pais confiavam neles. Hoje os alunos batem nos professores e os pais movem-lhes processos por danos morais se ousarem proibir algum menino de, por exemplo, brincar com o telemóvel numa aula.
Na minha aldeia havia tanta gente e tantas crianças que, em vez de uma, havia duas escolas. Para ser ainda mais direto, havia cá de tudo. Ninguém precisava de sair daqui o ano inteiro para ter quanto precisava para viver tranquilamente. Nem faltava trabalho para todos, desde cavar terra à enxada no campo, até aos senhores doutores da alfândega na Estação.
Convido quem quiser vir ver o que temos cá hoje, o que o progresso trouxe à minha terra, à minha freguesia e ao meu concelho. Tudo o que eram postos de trabalho e atividades económicas desapareceu. Nem uma triste lojinha para comprar um pacote de sal.
Porquê?
Porque, para vender uma garrafa de óleo, uma lata de feijão ou um quilo de açúcar nas aldeias do interior profundo, qualquer loja, tal como as de Lisboa ou Porto, tem de ter balcões e prateleiras de aço inoxidável, arcas frigoríficas com mil e um controles de temperaturas, mais uma caixa registadora de última geração que passe faturas e as comunique de imediato às finanças, nem que seja por um rebuçadito que um avô compre à neta...
E etecétera, etecétera, etecétera...
É minha profunda convicção que os ilustres senhores governantes dos últimos 49 anos, conseguiram dividir o meu país em várias classes, de um extremo ao outro. Oito para uns, oitenta para os outros, no que toca a direitos fundamentais. Existe hoje um país de 1ª classe para os privilegiados com chorudos ordenados e mordomias sem fim. CEO's, Administradores e similares, e, obviamente, a classe política que tratou de legislar nesse sentido em sede própria e em seu próprio proveito.
E etecétera, etecétera, etecétera...
É minha profunda convicção que os ilustres senhores governantes dos últimos 49 anos, conseguiram dividir o meu país em várias classes, de um extremo ao outro. Oito para uns, oitenta para os outros, no que toca a direitos fundamentais. Existe hoje um país de 1ª classe para os privilegiados com chorudos ordenados e mordomias sem fim. CEO's, Administradores e similares, e, obviamente, a classe política que tratou de legislar nesse sentido em sede própria e em seu próprio proveito.
Mas não só.
Também os protegidos à sombra das suas asas prosperam mais. Fortunas que vão surgindo ninguém sabe de onde, nem como. Muitas delas, dizem as más línguas, foram conseguidas à custa de esquemas ardilosos que captam os milhões vindos de Bruxelas que só são acessíveis a um punhado de eleitos e sempre os mesmos.
Porém e porque são precisos votos, alguma da raia miúda também vai debicando aqui e ali pequenas migalhas, para, em tempo oportuno, não se esquecer de votar e de também angariar votos a quem lhas concedeu. Essa é a 2ª classe que mama daqui e dacoli porque é familiar, amigo, afilhado ou protegido de algum "colarinho branco".
A 3ª classe é para quem não passa ainda fome e tem uma vida assim assim, nem carne, nem peixe, comámim, que usufruo de uma pensãozeca mais ou menos, apesar de o fisco ter inventado descontos tais que retém logo à cabeça um terço da mesma!
A 3ª classe é para quem não passa ainda fome e tem uma vida assim assim, nem carne, nem peixe, comámim, que usufruo de uma pensãozeca mais ou menos, apesar de o fisco ter inventado descontos tais que retém logo à cabeça um terço da mesma!
De 4ª classe em diante são a esmagadora maioria dos portugueses de hoje, infelizmente. Desemprego, precaridade, dívidas e fome em muitas casas num desinteresse vergonhoso, ultrajante e indigno, de quem tem o poder de fazer mais e melhor por TODOS os Portugueses.
Alguns, muitos mesmo, à semelhança dos anos 60 e como fez a minha irmã Luz, foram debandando para o estrangeiro.
Provavelmente muitos deles nunca mais voltarão a este país que pela incompetência dos seus governantes, os expulsou. Já não acreditam na democracia, na liberdade, no 25 de abril. Porque nada de bom trouxe às suas vidas. Hoje este país é uma pálida sombra daquilo que nos foi prometido em 1974.
Perseguiu-se e acossou-se tanta gente de todas as formas porque eram da pide, porque eram fascistas, porque eram cobras e lagartos. Hoje vemos, ouvimos e lemos, todos os dias, barbaridades cometidas em prejuízo de milhares de pessoas, desde falência de bancos a empresas que todos os dias engrossam o rol de famílias sem o seu ganha-pão, esquemas esquisitos de enriquecimento ilícito que lesaram e lesam ainda o erário público, obras gigantescas que originaram um acumular de dívidas e problemas para o presente e para o futuro, dívidas que meia dúzia de iluminados fizeram mas agora temos todos de pagar e não bufar.
E ninguém é responsabilizado por isso!
E ninguém é responsabilizado por isso!
É fácil pedir sacrifícios aos outros, quando se tem uma conta recheada no banco, automóvel e motorista por conta do estado, cama, mesa e roupa lavada, mais um ordenado de vários milhares de euros por mês. É fácil cortar no acesso aos cuidados de saúde de cidadãos maioritariamente carentes por velhice ou invalidez, quando se tem dinheiro para levar a família aos hospitais particulares onde são imediata e convenientemente atendidos.
É ainda também muito fácil falar da fome quando se tem a barriga cheia. Sinto vergonha de ter nascido num país que gerou gente assim porque tenho plena consciência de ter cumprido com dedicação e lealdade todos os meus deveres cívicos e profissionais. Durmo por isso todas as noites em paz comigo e com o mundo inteiro mas tenho pena de ter ensinado os meus filhos a serem homens honestos, íntegros, sérios e decentes, porque sei que eles assim nunca se irão safar.
Disse.
José Coelho
(Texto e foto)