Mas essa foi apenas uma das nossas primeiras aventuras. Depois desse dia já aconteceram muitos mais momentos de felicidade pura entre os dois.
Porque foi a primeira e tão desejada netinha? Talvez, não sei. É que, entretanto, já chegou também ao nosso colinho há pouco mais de um ano, a caçulinha Mariana, que, parece-me, vai ser mais uma grande fã do vô Zé Coelho. Avô baboso dirão vocês. Vô babão, diz a família do Brasil. E não me ofende nada tal juízo. Muito pelo contrário, pois adoro literalmente as minhas pequeninas. E se a Francisca é uma grande compincha do vô, a Mariana, ainda que mais bébézinha, não o é menos. Vem para o meu colo sem qualquer contrariedade. Conhece-me à légua, brinda-me com aqueles lindos sorrisos que tem sempre prontos e dorme grandessíssimas sestas se me sentir perto dela a guardar-lhe o soninho.
Vou hoje escrever sobre o mais recente gesto de espontâneo carinho que recebi há poucos dias da pipoquinha Francisca. Estávamos no meu carro, eu, ela e a avó Manuela em Montemor-o-Novo, à espera que chegassem os papás de quem tínhamos ido ao encontro a meio caminho depois de ela ter vindo passar uns dias com os vôs "tudis". Primeiro fui o lobo mau na história do capuchinho vermelho - interpretado por ela na perfeição - e despoletando sonoras gargalhadas quando eu imitava a voz do lobo "É p'ra te ver beeeeemmm!" quando ela me perguntava: "Avó, tens uns olhos tãããooo grandes!!!"
Depois o cenário mudou e passei a ser um tenebroso fantasma, uivando um "búúúúúú" muito sinistro, colocando sobre a cabeça a fralda de bebé que faz de lençol da cama da boneca que ela traz sempre consigo. Resultado, mais meia dúzia de felizes gargalhadas. Não cabia em si de contente, feliz, divertida. Os condutores e passageiros Montemorenses que circulavam nos seus carros pela rua olhavam admirados o enorme reboliço e agitação dentro daquele pequeno Corsa estacionado no parque da Rodoviária do Alentejo.
Não podiam nem imaginar que tão pequeno palco estivesse a ser o cenário de tão movimentadas aventuras...
Ligámos aos papás a saber se ainda demoravam. Já estão perto. A pequenita, entretanto, faz um lanchinho porque são horas. Miminho da avó Manuela, uma belíssima fatia de bolo de cenoura - ou não fôssemos nós Coelhos - e dois iogurtes Yoco de beber com palhinha. Satisfeita e notoriamente feliz, a dado momento a pequenita agarrou a minha mão direita e... beijou-a várias vezes num carinho tão puro, inocente e tão verdadeiro que se me marejaram instantaneamente os olhos de lágrimas. Fiquei tão... tão... tão... Grato, feliz, comovido. A minha mão a ser carinhosamente beijada por um dos dois anjos com que Deus abençoou a minha vida.
Há muitos, muitos anos atrás, também eu beijava assim as mãos dos meus avós a pedir-lhes "a bença" porque era obrigatório naquele tempo. Ao chegar junto deles pela primeira vez no dia, fosse onde fosse, tínhamos de pedir-lhes:
- A sua bença,
avó/ avô.
Imediatamente
eles nos apresentavam as costas da sua mão direita para ali depositarmos um
reverente beijinho enquanto que eles murmuravam com doçura:
- Deus te
abençoe, meu neto.
E eu amava-os como as minhas netas parecem amar-me também a mim. Bem diz o povo que nesta vida tudo quanto semearmos, um dia iremos colher.