A propósito da mediática fuga de cinco prisioneiros do Estabelecimento Prisional de Vale de Judeus classificado como de alta segurança, está em curso o cabal apuramento de responsabilidades que seguramente jamais irão ser imputadas a algum governo, ministro, secretário de estado ou magistrado por má gestão da "coisa", nem sequer aos responsáveis diretos, um dos quais, mal se sentiu "apalpado" pelo clamor público, apresentou convenientemente a sua demissão. Resta já só então analisar ao ínfimo pormenor quem, quando, onde e como, seguramente do corpo dos guardas prisionais, terá sido o culpado daquilo tudo.
E vem-me à memória outra história menos grave mas não menos escabrosa de um furto de armamento num determinado estabelecimento militarizado que originou um exaustivo inquérito para apuramento de responsabilidades. Logicamente que, por A + B, se concluiu que a culpa não fora do comandante da unidade, muito menos de qualquer outro graduado seu subordinado, tendo recaído toda a culpa no praça que desempenhara funções de quarteleiro de dia, algures por aquela data. Difícil e assertiva conclusão, se tivermos em conta que nunca ninguém conseguiu apurar em que dia de semana ou de mês o armamento havia desaparecido!
Então, por não haver "culpado" de menor graduação, lá papou o indignado soldado quarteleiro-de-dia a "castanha" que, pior do que a gritante injustiça, se sentiu de tal modo humilhado que no dia seguinte ao término do castigo requereu oficialmente a sua intenção de abandonar definitivamente a profissão que quando ainda era ainda um jovem, elegera. E voltou para a sua agricultura onde o trabalho é bem mais duro e cansativo mas onde também não há injustiças de tamanha envergadura.
Toda
a gente sabe que as atividades policiais das forças de segurança e similares, sejam elas quais forem, nunca param dia
e noite porque o serviço tem de ser assegurado 24 sobre 24 horas de 1 de Janeiro a
31 de Dezembro seja Natal, Páscoa, outros feriados ou fins-de-semana.
Enquanto
o cidadão comum em dezembro consoa feliz o seu natalício bacalhau e as filhós no aconchego familiar ou degusta depois na primavera o pascal cabrito assado no forno e
se diverte, outros cidadãos exatamente iguais a eles mas menos comuns nos direitos e deveres, têm, nessas noites e nesses dias, que permanecer nas ruas, estradas,
esquadras e postos, prontos para acorrer a qualquer anormalidade no desempenho da complexa profissão que deles exige disponibilidade permanente e total.
Ah
pois… E coisa… Foram para lá porque
quiseram, são pagos para isso, estão lá porque querem, se não gostam vão-se embora…
É
fácil tirar conclusões que não passam de mera retórica. Difícil é conseguir perceber-se o respeito que merece o desempenho
de tão exigentes e nada fáceis funções. Mais difícil ainda é perceber a intolerância geral perante qualquer
falha, erro ou omissão cometidos por algum agente da autoridade, deixando de se ter em conta que sob cada farda se encontra também um falível Ser Humano sujeito a cometer faltas ou omissões, o qual, como qualquer outro, deveria sempre também ser merecedor de mais humana compreensão.
É para mim sumamente confrangedor verificar a brandura "do nosso sistema" para com marginais capazes de darem um
tiro e matar uma pessoa à queima-roupa para a roubarem depois, a serem considerados, com a maior tolerância e humanidade, "indivíduos problemáticos com dificuldades de inserção
social” gastando-se milhares de euros do erário público para os “ajudar” a reintegrarem-se sabendo-se de antemão que não irá resultar.
Em
contrapartida, um agente da autoridade que precise efetuar um disparo com a
arma que lhe está distribuída para o desempenho das suas funções e para dela fazer uso no integral cumprimento do seu dever conforme
está transcrito na lei "... em defesa da sua própria integridade
física ou de terceiros, para impedir ou evitar por todos os meios ao
seu alcance o cometimento de crime iminente ou em já em curso..." mas se dela tiver de fazer uso, logo a seguir o seu comportamento é analisado ao pormenor por meio mundo a começar
de cima e crucificado na praça pública, ele sim vítima depois de burocracias absurdas, de conclusões fáceis, cómodas e
popularuchas que o "condenam" porque “excedeu” ou “abusou” da sua
autoridade e competências.
Não
faz sentido! Cá para mim, sinceramente, os valores fundamentais do nosso
País andam completamente invertidos, ou a ser muito mal interpretados.
E
quando tais coisas acontecem, quem vem dar a cara em defesa do agente da
autoridade?
A
cadeia hierárquica de comando?
Sim!
Normalmente, para pública e pomposamente, anunciar que já foi instaurado processo de averiguações para o cabal apuramento de
responsabilidades.
A
Comunicação Social?
Muito pelo contrário, porque naturalmente ela precisa da
notícia para vender o produto e para o conseguir todos os meios justificam os fins. Não há deontologia
profissional que valha.
A
Opinião Pública?
Pior um pouco! Se uma voz disser “matem-no” outras cem dirão
em coro “esfolem-no”…
Porque
será que tantos guardas e polícias se têm suicidado ultimamente?
Será porque…
- São devidamente apoiados?
- É uma profissão muito compensadora?
- É fácil?
- Passam a vida de papo para o ar a gozarem os seus chorudos rendimentos
de pouco mais que o ordenado mínimo nacional?
Já fui um deles. Por isso os compreendo tão bem e os defendo publicamente com
unhas e dentes. Eu também errei inadvertidamente algumas vezes. Quem é que
nunca erra? Só
posso garantir com absoluta certeza que nunca agi deliberadamente dessa forma. Nem para
exceder o uso da minha autoridade, nem para impor a minha vontade, nem por
simples maldade, arrogância, desleixo ou má fé.
Errei
porque... estava a trabalhar. Errei porque... estava no desempenho das minhas funções legais nas quais fui, como todos eles, publicamente investido. E porque
estava decerto também, a cuidar do superior interesse da comunidade ou de
alguém que individualmente necessitava de ajuda. Errei
porque sou humano e como tal imperfeito. Como todos vós que estais
a ler isto neste momento e também todos aqueles que apregoam moralidade mas não
sabem ver-se ao espelho nem pôr a mão na consciência.
Todos
erramos.
Mas também todos temos os mesmos direitos perante a lei.
A terminar poderia referir a minha extensa folha de serviços
prestada à Causa Pública durante os anos em que a servi e foram hierárquica e publicamente reconhecidos de diversos modos, na qual não
existe a menor mancha nem consta a mais ínfima irregularidade. Antes pelo
contrário. Poderia,
mas não vou referi-la. Apesar de me haver sensibilizado muito o seu reconhecimento, nunca me envaideci. Senti sempre e apenas ter cumprido com o meu dever no desempenho das obrigações profissionais em que estava investido.
Basta-me a consciência profundamente tranquila e esta paz de espírito que me proporcionam a mais absoluta serenidade no viver de cada dia. Mas continuo a ser e serei sempre solidário com quem por lá continua, 24 sobre 24 horas, 365 dias por ano, a dar o seu melhor pela segurança e tranquilidade de todos nós.
Basta-me a consciência profundamente tranquila e esta paz de espírito que me proporcionam a mais absoluta serenidade no viver de cada dia. Mas continuo a ser e serei sempre solidário com quem por lá continua, 24 sobre 24 horas, 365 dias por ano, a dar o seu melhor pela segurança e tranquilidade de todos nós.
José Coelho
Texto e foto