Quem é que não teve já a
oportunidade de conhecer uma pessoa idosa e enferma, dependente, carente e
solitária?
Talvez essa pessoa esteja dentro do seu próprio lar. Uma mãe ou um pai, incapacitados pela enfermidade ou pelas debilidades impostas pela idade.
Alguém que ontem foi forte e dinâmico, mas agora se movimenta com lentidão e às vezes nem se movimenta, tornando-se totalmente dependente da vontade alheia.
Quem tiver uma mãe, um pai ou outro familiar nessas condições, pare um pouco, olhe nos olhos dessa pessoa e tente ler os seus mais secretos pensamentos.
Tente perceber nos seus olhos tristes ou nos seus lábios mudos o apelo comovente que eles não têm coragem de verbalizar.
Se esse apelo fosse audível, provavelmente seria assim:
- Tu que estás na flor da idade, acredita que o despertar da vida é como o amanhecer em que tudo parece brilhar mais quente e mais alegre. Mas o amanhecer não é eterno e a ele se vão sucedendo todas as outras fases do dia...
Não te esqueças que já sou velho e se por acaso vires a minha mão tremer ou o meu andar hesitante, ampara-me por favor.
Se minha audição já não é boa e tenho de me esforçar para ouvir o que tu estás a dizer, tem compaixão.
Se a minha visão é imperfeita e o meu entendimento já é escasso, ajuda-me com paciência.
Se as minhas mãos tremem tanto que derrubam as coisas para o chão, por favor não te irrites, porque eu tentei fazer o melhor que pude.
Se me encontrares na rua, não faças de conta que não me vês; cumprimenta-me e conversa um pouco comigo. Sinto-me tão só...
Se na tua sensibilidade me encontrares triste entre tantos outros que também o estão, reparte simplesmente um sorriso comigo e com eles. Sê solidário, nós apenas necessitamos de um pouco de carinho.
Se te contei já pela terceira vez a mesma história, não me repreendas. Escuta-me simplesmente e, se eu não digo já coisa com coisa, não te rias de mim.
Se estou doente e caminho com dificuldade, não me abandones, porque preciso que o teu braço forte ampare os meus passos.
Sabes, eu já vivi muitas primaveras e vivo agora no meu outono, enquanto o derradeiro pôr-do-sol se aproxima. Porque o ocaso da vida, é como o entardecer: indica que vem chegando o momento de partir.
Por isso te peço que me perdoes se tiver medo da morte e que me ajudes a aceitar o adeus.
Fica mais tempo comigo para me dares segurança, porque os cabelos brancos e as rugas do meu rosto não impedem que eu precise de repousar a minha cabeça num colo seguro como o teu.
Sei que o comboio da vida em breve vai parar na minha estação e que terei de embarcar sozinho, como sozinho desembarquei nesta estação um dia.
Por tudo isso te peço para que não me negues alguma atenção e carinho.
Brevemente, rumarei para outra dimensão:
A da vida eterna.
E nunca esqueças que o meu lugar de hoje virá ser o teu um dia...
Autor desconhecido
in Histórias do Cota