segunda-feira, 1 de maio de 2023

A praia da minha juventude

Rio Sever - Foto da net

Não havia outras praias no nosso limitado horizonte. Nem algarves, nazarés ou vilasnovasdemilfontes... Não havia piscinas da portagem, muito menos nos quintais das casas como já vai havendo agora. Havia, quando muito, a barragem da Póvoa para alguns sortudos cujos pais tinham carro e lá iam dando boleia e levando a passar o dia com eles, algum amigo menos afortunado.

O Rio Sever era pois a praia preferida mais próxima e apetecível de todos nós, com os açudes de verão feitos para o regadio das várzeas adjacentes às suas frescas margens. Retorta, Matinho, Herdade dos Pombais, Amendoeiras. Havia ainda o pego "do garcia" e muitos outros, rio abaixo ou rio acima. 

E todos eles eram ponto de encontro para diversos eventos anuais, familiares ou coletivos.

Os festejos "das sortes" da rapaziada do concelho começavam sempre com dois dias de petiscos, banhos e folia no rio, com acordeonista e tudo. Só depois é que se ia a Marvão de fato e gravata, seguindo-se o desfile pelas ruas das freguesias e o baile dos "apurados" para a vida militar. Nem a hipótese da ida para a guerra quebrava o brilho e a alegria do evento.

Também os "festeiros" das diversas comissões de festas anuais das freguesias se reuniam sempre em alegres almoçaradas de confraternização e convívio no rio, a desfrutarem a frescura das copas dos amieiros e salgueiros pelos juncais que bordejam de verde as suas bonitas margens, findos os - por vezes bastante cansativos - festejos e encerradas as contas com saldos positivos.

Muitas famílias que tendo por cá as suas raízes mas a vida levou para outras paragens, escolhiam também o verão e as datas festivas a ele associadas para virem visitar pais e avós, tios ou primos. E era inevitável pelo menos uma ida ao rio para uma pescaria, um almoço, uma festa em família naquele mítico curso de água que não só era linha de fronteira entre Portugal e Espanha, como também ponto de encontro para dias muito bem passados e felizes.

Foi sem dúvida um local de eleição para celebrar a amizade, a família e a coletividade. E lá continua até hoje, o nosso Rio Sever. Bonito, fresco, apetecível. Só que agora passam-se anos, décadas talvez, sem que nas suas frondosas margens apareçam já aqueles grupos de alegres convivas como antigamente. O mundo mudou. As pessoas também. Para melhor em muitas coisas, é certo. Para pior, naquela que devia ser a parte imutável de todos nós: 

A capacidade de conseguirmos ser felizes hoje com tão pouco, como éramos naquele tempo...

José Coelho