quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Coisas que leio...


MAIS DO QUE A MORTE, ASSUSTA-ME A SOLIDÃO DOS VELHOS

Este flash de fim de vida, intensamente estampado na fotografia, de Jorge Vieira, cala bem no fundo da nossa sensibilidade, não pela sombra do companheiro que partiu, já liberto e descansado das dores do corpo e da alma, mas pela irreversível solidão da que ainda espera pelo começo dessa viagem.

Tudo dói na crueza desta imagem. É a expressão no rosto da velha senhora e o seu corpo, que se adivinha ressequido, escondido numa roupa que, por isso, ficou vários números acima. São os sapatos e as meias, de quem não tenciona sair à rua. É a toalha, grande demais para a pequena mesa a dois, agora dobrada e a dizer que, estendida, serviu uma família inteira que se esfumou. Pelos vincos bem marcados, esta toalha, talvez de linho, que ela própria bordou em tempos de jovem casadoira, a juntar ao enxoval, mostra que acabou de sair de um velho baú, com anos e anos de dobrada e adormecida ao lado de um saquinho de alfazema.

Texto e imagem integralmente copiados da página do Professor António Galopim de Carvalho, no facebook