MAIS
DO QUE A MORTE, ASSUSTA-ME A SOLIDÃO DOS VELHOS
Este
flash de fim de vida, intensamente estampado na fotografia, de Jorge Vieira,
cala bem no fundo da nossa sensibilidade, não pela sombra do companheiro que
partiu, já liberto e descansado das dores do corpo e da alma, mas pela
irreversível solidão da que ainda espera pelo começo dessa viagem.
Tudo dói na crueza desta imagem. É a expressão
no rosto da velha senhora e o seu corpo, que se adivinha ressequido, escondido
numa roupa que, por isso, ficou vários números acima. São os sapatos e as
meias, de quem não tenciona sair à rua. É a toalha, grande demais para a
pequena mesa a dois, agora dobrada e a dizer que, estendida, serviu uma família
inteira que se esfumou. Pelos vincos bem marcados, esta toalha, talvez de
linho, que ela própria bordou em tempos de jovem casadoira, a juntar ao
enxoval, mostra que acabou de sair de um velho baú, com anos e anos de dobrada
e adormecida ao lado de um saquinho de alfazema.
Texto e imagem integralmente copiados da página do Professor António Galopim de Carvalho, no facebook