quinta-feira, 2 de fevereiro de 2023

Beirã, da passarada…

Ninho da carriça na trepadeira da varanda da Toca dos Coelhos
Foto Pedro Coelho


Não sei porquê, a minha casa é pouso favorito de toda a espécie de passarada desde que cá moro. As carriças fizeram ninho anos a fio em dois locais distintos. No alpendre do forno do quintal antes de ele ter o portão de ferro que tem hoje na entrada e na trepadeira da varanda entre o emaranhado de folhas e caules. Tenho algumas fotos que o atestam. Os pintassilgos, um ano até fizeram o seu na roseira trepadeira da frontaria da casa, mas todos, todos os anos, fazem mais do que um na latada do quintal. 

Por sua vez os verdelhões preferem a solidez das oliveiras.

Também tenho de hóspedes um casal de melros que vem todas as noites dormir na varanda do primeiro andar. Um deles, não sei se o macho se a fêmea, dorme sobre o braço da lanterna do alpendre. O outro dorme no parapeito de uma das janelas laterais da casa de banho, comodamente instalados e resguardados. Isto acontece há três ou quatro anos, seguramente.

Sempre que necessitamos lá ir depois de anoitecer, lá encontramos os dois, provavelmente para fugirem do frio no inverno e do calor no verão. Nunca os enxotámos, pelo contrário, tentámos sempre incomodar quanto menos melhor. Assim que sentem a porta a abrir quando nós invadimos o seu dormitório, esvoaçam para o cume do telhado em frente e regressam imediatamente à varanda, após sairmos.

Há dois anos, uma cegonha decidiu que uma das chaminés da casa era um excelente local para nidificar. Não teve sorte porque eu não deixei e vigiei-a para a espantar batendo tampas de tachos cada vez que ela ali pousava com paus no bico. O telhado em volta da chaminé já parecia, entretanto, o estaleiro da lenha do meu amigo João Picado. Ná… Cegonhas não. Gosto delas, respeito-as, mas fazem demasiado lixo, danificam com ele os telhados e eu não sou rico.

Na passada primavera, foram os pardais. Outra dor de cabeça e uma batalha dura de vencer, porque eles são ainda mais teimosos que eu. Onde haviam estes atrevidos inquilinos de imaginar construir o ninho nesse ano? Na parte de trás do motor de um dos ares condicionados, aproveitando o espaço estreito e o apoio dos tubos que ligam a máquina ao ventilador do quarto. Também não deixei, porque as palhas infiltradas na grelha do motor podiam danificar o aparelho. Mas tantas vezes o derrubei, como eles voltavam a tentar.

Até que um dia desistiram. 

Ou pensei eu que eles tinham desistido!

Por essa altura o esquentador da cozinha que simultaneamente serve a água quente às duas casas de banho do rés-do-chão, começou a deixar de funcionar regularmente como funcionara até então. Apagava-se subitamente. E como possui um sensor preventivo que desliga o aparelho automaticamente quando se acumulam gases tóxicos à sua volta, pensei que seria isso. E vá de abrir a porta da cozinha para arejar o espaço, até que, intrigado, um dia lembrei-me de ir dar uma espreitadela na boca do tubo exaustor do mesmo.

E… 

Eureka!

Lá estava a causa. Os ditos cujos pardais teimosos tinham lá metido um amontoado tal de palhas para fazerem o ninho, que quase entupiram o tubo. Devem-no ter feito quando fomos aos Açores e o esquentador não funcionou durante uns dias, abandonando-o imediatamente quando levaram com os gases e os calores da combustão do gás, assim que regressámos a casa. Mas a "rolha" de feno ficou lá, a impedir o correto funcionamento do aparelho. 

É preciso ter lata! 

E esperteza...

- Não nos deixas fazer a casa no ar condicionado, fazemos neste tubo onde tu não vês…  

Tirei o projeto falhado de ninho e coloquei uma rede na boca do tubo para que os meninos não repitam a gracinha. 

Agora resta-me aguardar para ver onde será a próxima tentativa, porque aposto que vai haver.

Devo confessar contudo que, apesar de todos estes contratempos, adoro indiscriminadamente todos estes meus inquilinos, mesmo quando me deixam as hortaliças do quintal depenicadas de tal modo que as suas folhas mais se parecem aos alinhavados de Nisa do que a couves para caldo verde.

Haja Deus, porque todos precisamos de comer para viver...

José Coelho