Memória. Luz que nunca apaga
Foto by José Coelho
COMO A VIDA MUDA COM A MORTE DOS PAIS
Depois da morte dos pais, a vida muda
muito. Enfrentar a orfandade, inclusive para pessoas adultas, é uma experiência
surpreendente. No fundo de todas as pessoas sempre continua vivendo aquela
criança que pode correr para a mãe ou o pai, para se sentir protegido. Mas
quando eles vão embora, essa opção desaparece para sempre.
Você irá deixar de vê-los, não por uma
semana, nem por um mês, mas sim pelo resto da vida. Os pais foram as pessoas
que nos trouxeram ao mundo e com quem você compartilhou o mais íntimo e frágil.
Já não estarão presentes aqueles seres pelos quais, em grande parte, chegamos a
ser o que somos.
A morte dos pais: entre falar dela e
vivê-la, existe um grande abismo
Nunca estamos plenamente preparados
para enfrentar a morte, ainda mais quando se trata da morte dos pais. É uma
grande adversidade que dificilmente pode ser superada totalmente. Normalmente,
o máximo que se consegue é assumi-la e conviver com ela. Para superá-la, pelo
menos em teoria, deveríamos entendê-la, mas a morte, no sentido estrito, é
totalmente incompreensível. É um dos grandes mistérios da existência: talvez o
maior.
Obviamente, a forma como assimilamos as
perdas tem muito a ver com a forma como aconteceram. Uma morte das chamadas por
“causas naturais” é dolorosa, mas um acidente ou um assassínio é muito mais. Se
a morte tiver sido precedida por uma longa doença, a situação é muito diferente
de quando acontece de forma súbita.
Também influencia o tempo entre a morte
de um, do outro: se houve pouco tempo, o luto será mais complexo. Se ao
contrário, o lapso for mais extenso, certamente a pessoa estará um pouco melhor
para aceitá-lo.
Não é apenas o corpo que se vai mas sim
todo um universo. Um mundo feito de palavras, de carícias, de gestos.
Inclusive, de repetidos conselhos que às vezes irritavam um pouco e de “manias”
que nos faziam sorrir ou esfregar a cabeça porque os reconhecemos nelas. Agora
começam a fazer-se sentir ausentes de uma forma difícil de lidar.
A morte não avisa. Pode ser presumida,
mas nunca anuncia exatamente quando irá chegar. Tudo se sintetiza em um
instante e esse instante é categórico e determinante: irreversível. Tantas
experiências vividas ao lado deles, boas e ruins, se estremecem de repente e
ficam somente em lembranças. O ciclo se cumpriu e é hora de dizer adeus.
“O que está, sem estar…”
Em geral, pensamos que esse dia nunca
chegará, até que chega e se faz real. Ficamos em estado de choque e vemos
apenas um caixão com o corpo rígido e quieto que não fala e não se move. Que
está ali, sem estar já ali…
Porque com a morte começam a ser compreendidos
muitos aspectos da vida das pessoas falecidas. Aparece uma compreensão mais
profunda. Talvez o facto de não ter as pessoas queridas presentes suscita em
nós o entendimento sobre o porquê de muitas atitudes até então
incompreensíveis, contraditórias ou mesmo repulsivas.
Por isso, a morte pode trazer consigo
um sentimento de culpa frente àquele que morreu. É preciso lutar contra esse
sentimento, já que não acrescenta nada e afunda em mais tristeza, sem poder
remediar nada. Para quê culpar-se se você não cometeu nenhum erro? Somos seres
humanos e acompanhando essa despedida, precisa existir um perdão: do que se vai
para com aquele que fica ou do que fica para com aquele que se vai.
Aproveite-os enquanto puder: não
estarão aí para sempre
Quando os pais morrem,
independentemente da idade, as pessoas costumam experimentar um sentimento de
abandono. É uma morte diferente das outras. Por sua vez, algumas pessoas se
negam a dar a importância que o facto merece, como mecanismo de defesa, em forma
de uma negação encoberta. Mas esses lutos não resolvidos retornam em forma de
doença, de fadiga, de irritabilidade ou sintomas de depressão.
Os pais são o
primeiro amor. Não importa quantos conflitos ou diferenças tenham existido com
eles: são seres únicos e insubstituíveis no mundo emocional. Mesmo sendo autónomos
e independentes, mesmo que o nosso relacionamento com eles tenha sido tortuoso.
Quando já não estão passa a existir uma sensação de “nunca mais” para uma forma
de proteção e de apoio que, de uma forma ou de outra, sempre esteve ali.
Na verdade, quem
não conheceu seus pais ou se afastou deles em uma idade precoce, geralmente
carregou essas ausências durante toda a sua vida. Uma ausência que é presença:
existe, em seus corações, um lugar que sempre chama por eles.
Uma das grandes
perdas da vida é a dos pais. Pode ser difícil de superar se houve injustiça ou
negligência no tratamento deles. Então, enquanto eles estão vivos, é importante
perceber que não ficarão para sempre. Que são, geneticamente e
psicologicamente, a realidade que nos deu origem. Que eles são únicos e que a
vida vai mudar para sempre quando eles partirem.
Fonte: La Mente
es Maravillosa
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