quarta-feira, 21 de setembro de 2022

Coisas que escrevi



Foto Maria Coelho

Desde muito pequenininha, logo no início de 2012 quando chegou ao nosso colinho, que entre nós se estabeleceu uma empatia mútua, um carinho indisfarçável, uma cumplicidade deliciosa. As suas primeiras gargalhadas sonoras e repetidas uma série de vezes, foram provocadas por mim, na minha casa, num serão em família, na brincadeira os dois. Teria, não sei muito bem, meia dúzia de meses, pouco mais. O pai, estupefacto com a cena e o efeito, gravou, sem nós nos darmos conta, aquele momento num vídeo que ainda hoje nos faz rir a bom rir quando o revemos. Mas essa foi apenas uma das nossas primeiras aventuras. Depois desse dia já aconteceram muitos mais momentos de pura felicidade entre os dois.

Porque foi a primeira e tão desejada netinha? Talvez, não sei. É que, entretanto, já chegou também ao nosso colo, há pouco mais de um ano, a caçulinha Mariana, que, parece-me, é mais uma grande fã do vô Zé Coelho. Avô baboso dirão vocês. Vô babão diz a família do Brasil. E não me ofende nada tal juízo. Muito pelo contrário, pois adoro literalmente as minhas duas pequeninas. E se a Francisca é uma grande compincha do vô, a Mariana, ainda que mais bébézinha, não o é menos. Vem para o meu colo sem qualquer contrariedade. Conhece-me à légua, brinda-me com aqueles lindos sorrisos que tem sempre prontos e dorme grandessíssimas sestas se me sentir perto dela a guardar-lhe o soninho.

Não posso, porém, deixar de vos contar a mais recente prova de carinho que recebi há poucos dias da pipoquinha Francisca. Estávamos no meu carro, eu, ela e a avó Manuela em Montemor, à espera que chegassem os papás de quem tínhamos ido ao encontro a meio caminho, depois de ela ter vindo passar uns dias com os vôs "tudis". Primeiro fui o lobo mau na história do capuchinho vermelho - interpretado por ela na perfeição - e despoletando as tais sonoras gargalhadas quando eu imitava a voz do lobo "É p'ra te ver beeeeemmm!" quando ela me perguntava: "Avó, tens uns olhos tããão grandes?" Depois, o cenário mudou e passei a ser um fantasma, gemendo um "búúúúúú" muito sinistro, colocando sobre a cabeça uma fralda que faz de lençol da cama da boneca que ela traz sempre consigo. Resultado, mais meia dúzia de felizes gargalhadas. Não cabia em si de contente, feliz, divertida. Os condutores e passageiros que circulavam nos seus carros pela rua em frente, olhavam admirados o reboliço e agitação dentro daquele corsa estacionado no parque. Não podiam nem imaginar que tão pequeno palco estivesse a ser cenário de tão movimentadas aventuras...

Ligamos aos papás a saber se ainda demoravam. Já estão perto. A pequenita, entretanto, faz um lanchinho, que são horas. Miminho da avó Manuela, uma belíssima fatia de bolo de cenoura  - ou não fôssemos nós Coelhos - e dois iogurtes yoco de beber com palhinha. Satisfeita, notoriamente feliz, a dado momento a pequenita agarrou-me a mão direita e... beijou-ma várias vezes com um carinho tão puro, tão inocente e tão verdadeiro que se me encheram instantaneamente os olhos de lágrimas. Fiquei tão... tão... tão... Grato, feliz, comovido. A minha mão carinhosamente beijada por um dos dois anjos com que Deus abençoou este outono da minha vida. 

Há muitos, muitos anos atrás, também eu beijava assim as mãos dos meus avós para lhes pedir "a bença". Era obrigatório naquele tempo. Ao chegar junto deles pela primeira vez nesse dia, fosse onde fosse, tínhamos de dizer-lhes:

- A sua bença, avó/ avô. 

E imediatamente eles nos apresentavam a costa da sua mão direita para ali depositarmos um reverente beijinho ao mesmo tempo que eles murmuravam com doçura:

- Deus te abençoe, meu neto.

E eu amava-os assim, como as minhas netas parecem amar-me agora a mim. Bem dizem que, nesta vida, tudo quanto damos e fazemos nos será devolvido...

José Coelho
Setembro 2015