A Sócha e o Miradouro da Beirã são um legado de dois Conterrâneos Beiranenses de gema, que tiveram, durante o mandato autárquico de Presidente da Junta de Freguesia da Beirã de um deles, a feliz inspiração de conferir alguma dignidade e embelezar o gigantesco Cancho plantado no centro da aldeia entre a Avenida Dr. António de Matos Magalhães a poente e a Rua Miguel Barcelos Maia que lhe fica paralela, a nascente.
Os dois foram grandes amigos toda a sua vida e nutriam, como eu, um profundo amor por esta aldeia onde nasceram. Um dos dois ao chegar a moço, optou pela carreira militar e foi um distinto Oficial Paraquedista mas nunca deixou de regressar frequentemente sempre que podia em visita à sua mãe, a querida Mestra que tomou conta de mim entre os 2 e os 6 anos para que a minha mãe pudesse ir trabalhar. O segundo dos dois, ao terminar o SMO (serviço militar obrigatório) ingressou na Guarda Fiscal sem também nunca perder a sua Beirã de vista.
E foi já na situação de aposentados os dois que um deles foi eleito Presidente da Junta de Freguesia. Nada daquilo que estou a escrever é fruto da minha imaginação porque sendo amigo dos dois quase desde que nasci, sempre os estimei e respeitei. E um dia em amena conversa com o então Presidente da Junta, ele disse-me que o nosso amigo de infância lhe dissera que era capaz de ficar bonito um Miradouro no Cancho da Escola.
Foi nesse dia nasceu a ideia que frutificaria e daria azo à sua construção. Já a Sócha, terá sido uma também muito feliz ideia do então Presidente da Junta e que, tão harmoniosa e esteticamente ali ficou enquadrada a embelezar ainda mais o local pois como se pode ver as paredes circulares das duas construções foram executadas em pedra pedra seca respeitando os usos e costumes das ancestrais construções de toda esta região, tendo ficado ambas exatamente iguais.
Ouro sobre azul, acho eu!
Pena que, alguns anos mais mais tarde, o Município de Marvão, através de um projeto financiado maioritariamente por fundos europeus, decidiu ajardinar o local e seus acessos. Mas foram tantos os acessórios modernos e inadequados à rusticidade e simplicidade daquele local, que, como se pode verificar, retiraram muito encanto e feriram a harmonia às construções já existentes.
Corrimões que ninguém usa, papeleiras de acrílico, chafarizes ultramodernos que não funcionam, placa informativa metálica quase maior do que a porta de madeira da Sócha, iluminárias inestéticas nos acessos quase sempre sem luz, enfim, em vez de um modesto e rústico miradouro ficou a parecer uma árvore de Natal permanente.
Manda quem pode, mas nem sempre bem...
Nunca fui e continuo a não ser adepto da crítica bacoca, como infelizmente tanta gente o faz só porque sim. Amo a minha terra como a amavam aqueles dois ilustres Beiranenses que já não se encontram entre nós mas cuja memória continuo a estimar, a respeitar e não esqueço. Tal como eu, também eles nunca abandonaram a Beirã, por ela deram o melhor de si, sem estarem à espera de com isso alcançarem lucros ou vantagens, sempre mais atentos ao Bem da Comunidade do que aos seus próprios interesses.
Infelizmente nestes tempos estranhos que vivemos cada um olha apenas para o seu riquíssimo umbigo, nada faz se não tirar disso alguma vantagem para si ou para os seus. Propositadamente não vou referir o digno nome dos dois ilustres Beiranenses que neste escrito quero honrar e homenagear, porque continuo a ser seu amigo e eles merecem. As pessoas naturais da Beirã, da velhinha e modesta Beirã daquele tempo, sabem exatamente quem são sem qualquer sombra de dúvida.
Porque nós não somos o que temos mas aquilo que deixamos. E qualquer dos dois foram pessoas de bem, disponíveis, atentos, generosos, amigos leais. Estejam em paz. Eu continuo a ser-vos grato pela vossa amizade e até ao dia em que talvez possamos voltar a encontrar-nos de novo nessa outra dimensão onde reina a paz e terminam a ganância, a falsidade, a desunião.
José Coelho