"Que Interior é este a que cada vez menos ligam e poucos se importam? Para
onde nos leva a esperança? Que país é este onde uma cidade pesa mais do que
todas as outras? Dos 14 mil milhões de euros a fundo perdido do Plano de
Recuperação e Resiliência apenas 5% são destinados ao Interior de Portugal.
Sim, 5%. Dos 308 Municípios Nacionais, 165 são Territórios do Interior de
Portugal, mais de metade, portanto, sendo que todos juntos apenas conseguirão
usufruir de 5% da tal bazuca que aí vem. Tem mais força um piloto da TAP que
meio milhão de pessoas do Interior. Neste Interior apenas residem cerca de 17%
dos jovens portugueses, o que indica, com clareza, que ou se faz algo sério,
impactante e credível, ou a morte anunciada será uma cruel realidade. Se este
Interior fosse uma imensidão de Terra deserta, sem história e sem Património
(cultural, ambiental, arquitectónico e humano), eu ainda compreendia, mas este
Interior de Portugal é de uma dimensão patrimonial, a todos os níveis,
extraordinária. Séculos e séculos de conhecimento acumulado, utilizado até hoje
na cultura dos solos, na preservação do Património Cultural, na arte de fazer
acontecer, na particular forma de receber e na renovação permanente da
esperança em sobreviver. Deixar morrer este maravilhoso Interior é assassinar
parte do que somos, é matar à pedrada a memória dos nossos antepassados, é
violar a alma de quem resiste ao tempo. Não lutar por este Interior é não ser
inteligente, não ser audaz, não ser capaz. Um dia, nos anais da história, serão
muitas as gerações que serão apontadas como os assassinos do Interior, por nada
fazerem para o salvar. Um dia, nos anais da história, todos irão perceber que
jamais, partido algum, a partir da Capital do Império, se preocupou com este
pedaço de Terra e este incomensurável pedaço de gente. O Interior de Portugal
merece bem mais atenção do que qualquer Novo Banco ou qualquer TAP, mas sabemos
bem que jamais este Interior de Portugal se atreveria a alimentar tantos
sanguessugas quanto estas gamelas alimentam. De uma coisa é certa: se os Homens
e Mulheres que amam o Interior de Portugal estiverem à espera que alguém da
Capital do Império mexa uma palha que seja para mudar este paradigma, mais vale
emigrarem para Marte. Cabe a quem ama este pedaço de Território se unir e, a
uma só voz, reclamar o que é nosso por direito: igualdade no tratamento e no
acesso às ferramentas de desenvolvimento social, cultural e económico. Talvez
um dia, quando a água do mar subir desalmadamente, este pedaço de Terra ganhe o
valor que lhe é merecido."
Texto: Paulo Costa