Mãe…
Hoje
seria o dia do teu aniversário se estivesses ainda connosco. Mas mesmo não estando já cá, o dia 8 de Outubro há-de ser para sempre
o dia em que nasceste. Quantos anos farias? É
irrelevante. No meu coração continua a ser lembrada a tua força anímica, a tua
bondade e coragem, mas, sobretudo, aquele teu sorriso fácil como o da fotografia
que propositadamente escolhi para compor este meu texto. Uma foto que foi feita
pelo teu neto Pedro à mesa das refeições em nossa casa e que conseguiu captar na perfeição o
teu semblante habitualmente descontraído e feliz. É assim que quero
lembrar-te sempre.
Se
não tem sido fácil esquecer-me do sofrimento por que te vi passar nos últimos
meses da tua vida, tenho no entanto plena consciência que tudo quanto
humanamente esteve ao nosso alcance e nos foi possível fizemos, para tentar
ajudar-te e minimizar o teu desconforto. Sofri contigo como nem imaginas.
Doía-me profundamente assistir impotente à tua agonia lenta, dolorosa e
irreversível mas o teu coração tinha tanto de doce como de resistente e não se
rendeu facilmente, como tu também nunca te rendeste às tempestades e rudezas da vida
que não foram poucas.
A
ti devo tudo o que sou. Na humildade do teu analfabetismo foste melhor
professora do que muita gente letrada que conheço. Os livros de onde nos
ensinavas eram unicamente os exemplos diários e permanentes que nos transmitias, repletos sempre de impecável conteúdo. Dona e senhora de grandes virtudes, o asseio e a
arrumação eram a tua mais forte característica. Foste sempre de um brio excepcional
como dona de casa, esposa e mãe. Trabalhaste continuamente durante toda a tua
vida ajudando tudo e todos, por isso foste, inequivocamente, o pilar fundamental da
nossa família. Eras também promotora e praticante da mais absoluta honradez e seriedade.
Mereceste sempre, por tudo isso, a amizade o respeito e o carinho de toda a
gente que te conhecia.
Todos
os dias me lembro de ti, Mãe. E sinto tanto a tua falta. A minha vida desabou
por completo no dia 28 de Julho de 2014. Não por ter sido surpresa pois era um
fim anunciado há tempo suficiente para estarmos preparados. Mas não é assim.
Percebi nesse dia que nunca estamos e nunca estaremos preparados para perder
quem nos trouxe ao mundo. E se de verdade me doeu muito a partida do meu pai e teu
companheiro de quase toda a tua vida, porque me doeu terrivelmente sim, verdade é também que a tua partida me doeu infinitamente mais. Ele também perdeu a mãe
dele e minha avó Adelina e por isso sei que, onde quer que esteja, o Pai António
Coelho me entende.
Se
antes ia regularmente ao cemitério, hoje que devia ir mais, vou menos. Ainda
não consegui fazer o luto de ti por completo e fiquei demasiado perturbado as
poucas vezes que lá fui. E tu sabes que eu até não sou de muitas pieguices. Mas fui
sempre muito agarrado a ti, Mãe. E tu a mim também. Amava-mo-nos infinitamente
um ao outro. O momento mais doloroso da minha vida ocorreu na casa mortuária algumas
horas depois de teres partido. A família tinha ido não sei onde fazer não sei o
quê e fiquei só eu, da família próxima, à tua cabeceira, embora a sala
estivesse cheia de gente vizinha e tua amiga que quis estar ali a acompanhar-te.
De
súbito um pranto incontivel e profundo brotou finalmente da minha alma meio
estupidificada desde as três da tarde quando deste o teu ultimo suspiro
agarrada à minha mão e à mão da mana Joaquina. Acho que só naquele momento me
dei finalmente conta que te tinha perdido para sempre. E desatei a chorar
perdido de dor e angústia durante muito tempo sem conseguir e sem querer conter-me.
Só me lembro de a nossa vizinha Joaquina Brites se ter levantado da sua cadeira
bastante comovida para me vir confortar dizendo-me muito baixinho “não chores
já mais Zé Manuel, a tua Mãe deixou de sofrer e está agora em paz”.
Foi
tão duro, Mãe.
Cá
em casa o teu quarto mantem-se como era quando tu o habitavas. E os teus
“santinhos” e as demais “coisinhas” que eram tuas, continuam na cómoda do quarto algumas, na estante do meu escritório outras. Até os caramelos de café que me trazias sempre continuam guardados num frasco de vidro aqui ao lado das tuas outras coisas porque ainda não consegui deitá-los fora pese embora três anos
depois já não se devam poder comer. É, acho eu, uma forma de te sentir ainda perto
de mim.
Um
dia vou conseguir diluir mais este sentimento de profunda perda. Será talvez apenas uma
questão de mais algum tempo. Mas até agora ainda não consegui. E hoje é o dia do teu aniversario
natalício, Mãe. Onde quer que estejas e acredito que seja junto do meu pai, dos meus avós, dos meus tios e primos, obrigado pela Mãe maravilhosa que sempre soubeste ser. Como não posso cantar-te os parabéns, deixo no seu lugar e em tua memória um verso
lindo que adoro mas não sei quem escreveu:
Se Deus
atendesse um dia,
minha
prece ingénua e doce,
quem
fosse Mãe não morria,
por mais
velhinha que fosse.
Voltaremos a
ficar juntos Mãe e então será para sempre. Um beijo repleto do carinho imenso que punhas em cada um dos muitos que me deste durante toda a tua vida, felizmente para mim...