Foto José Coelho
O dia 11 de junho de 2021 é a data precisa para a qual o Estado Português agendou o início da tua pensão de velhice, querida companheira desde o dia 14 de Agosto de 1976. Quarenta e cinco anos de matrimónio prestes a cumprirem-se. Mas se o tempo de namoro contasse, seriam cinquenta em vez de quarenta e cinco.
Na prática, meio século de uma vida primeiro a dois, depois a quatro e agora a nove...
Obrigado por me acompanhares, me aturares e de todos nós cuidares há tantíssimo tempo, quantas vezes esquecendo-te de ti própria.
Sabes?
Um dia, sem querer e sem que vocês se dessem conta que eu estava ali, ouvi a minha velhinha mãe a dizer para ti:
- É tã chato o mê Zéi! Ê nã sei come tu tens paciênça para o aturar...
- Homessa! Pensei, meio indignado...
Porém, se a minha mãe o disse, ela era tão sábia e tão minha amiga, que devia ter mesmo razão. Sei que sou ranzinza mas não é por mal. Gosto das coisas ao meu jeito e nem sempre tenho a tua sensatez. A vida fez-me assim, ou melhor, a vida FEZ-NOS assim aos dois.
Não foi fácil a nossa meninice, como também não foi fácil a nossa adolescência. Tu perdeste a tua Mãe e melhor amiga aos dezasseis anos, eu fui para a tropa aos dezassete, ainda nem sequer tinha barba.
Mas já éramos namorados!
Casámos numa situação também pouco comum, eu a trabalhar na Beira Baixa a 200 quilómetros de vocês, família, tu operária da Celtex - Indústrias de borracha Lda. Estávamos juntos só de 15 em 15 dias durante 10 meses de cada ano, depois tu ias passar o mês de Agosto das tuas férias comigo à Barroca Grande e eu vinha a seguir convosco - contigo e já com o nosso Manãe - passar o mês de Setembro para o qual marcava sempre também as minhas.
Enfrentámos todas as dificuldades e mais uma, os dois juntos. Tu sempre formiguinha trabalhadeira, esposa, mulher e mãe extremosa - entretanto veio também o Pedrito - ingressei na GNR enquanto tu abandonaste a "tua" Celtex para tomares definitivamente conta dos rapazes e de mim, finalmente todos juntos como qualquer família, até que os filhos cresceram e começaram a voar do ninho.
Quando comprámos a nossa casa ao meu pai, imediatamente tu procuraste novamente emprego porque não tínhamos mais ninguém que nos pudesse ajudar a não ser o nosso vencimento mensal. Enquanto outras famílias iam de férias, para a praia, passear e arejar, nós amealhávamos todos os extras - subsídios de férias, de natal e mais algumas poupanças - para a reconstruir e readaptar.
Foi assim a tua vida ao meu lado. A cuidar de nós, discretamente, sem alardes, sem peneiras e sem queixumes. És uma Senhora, Maria Manuela Coelho. Uma Senhora com S grande. Uma Esposa como há poucas. Uma Esposa com E grande. És uma Mãe única. A Melhor Mãe e agora também Avó, do Mundo.
Nesta nova etapa que hoje se inicia, peço a Deus - mesmo aborrecido com ele por causa do ataque da víbora - que te dê pelo menos tantos anos de vida, como aqueles que trabalhaste e descontaste. E, se não for pedir demais, que continue a manter-nos assim juntos, na velhice como na juventude, para desfrutarmos a nossa reforma com a qualidade de vida, harmonia e saúde, possíveis.
Como dizia a tia Florinda, sou chatinho, mas gosto muito de ti.
Obrigado por tudo o que tens feito pela nossa Família, pois sem ti nada seria como é.
Parabéns pelo teu primeiro dia de reformada mesmo distante de mim e um beijinho com muitas saudades.
Volta breve, mas só quando já estiveres bem de saúde.
José Coelho
11.06.2021