quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Coisas que leio...


Imagem copiada do Google

Soneto do Tempo

Deus pede hoje estrita conta do meu tempo
E eu vou, do meu tempo, dar-lhe conta.
Mas como dar, sem tempo, tanta conta
Eu que gastei sem conta tanto tempo?

Para ter minha conta feita a tempo,
O tempo me foi dado e não fiz conta.
Não quis, tendo tempo, fazer conta.
Hoje quero fazer conta e não há tempo.

Oh! Vós, que tendes tempo sem ter conta,
Não gasteis vosso tempo em passatempo.
Cuidai, enquanto é tempo em fazer conta.

Pois aqueles que sem conta gastam tempo,
Quando o tempo chegar de prestar conta,
Chorarão, como eu, se não der tempo.


António das Chagas

sábado, 20 de fevereiro de 2016

Tiro o chapéu a este excelente artigo de opinião...


Imagem copiada do Google

Tudo está armadilhado

  José Pacheco Pereira -  20/02/2016 - Público - Opinião

A “Europa” actual quer a queda do governo Costa e por isso o humilha com novo pacote de austeridade, e força a ruptura com o BE e o PCP.

Eu já não estou muito para surpresas, mas ainda tenho alguma capacidade de ficar surpreendido. E por isso me surpreende a ligeireza, para não dizer irresponsabilidade, como que os partidos da actual maioria tomam o que estão a fazer, ou melhor, o que não estão a fazer. Ou seja, meteram-se num curso muito arriscado, perigoso, cheio de dificuldades, e comportam-se como se houvesse uma qualquer normalidade na actual situação que ajudaram a criar, e como se pudessem continuar a fazer política “habitualmente”.

Preciso desde já que esse curso — um governo minoritário PS com apoio parlamentar do BE e do PCP — me parece positivo, para puxar a alavanca para o lado oposto daquele para que estava toda inclinada, à direita, e assim abrir caminho a um recentramento da vida política portuguesa. Hoje, a única possibilidade de um regresso ao centro, — centro-esquerda, centro-direita —, é haver sucesso num governo de centro-esquerda que acabe com o estado de excepção que era o “ajustamento” eterno, com uma efectiva limitação à democracia e a perda quase total da soberania.

Se Costa não tivesse rompido com o “arco de governação”, a governação PSD-CDS continuaria exactamente a mesma política, porque ela é pensada como sendo para 20 ou 30 anos, como se isso fosse possível em democracia e, como não teria resultados, teria que ser eterna. Para ser “eterna” teria que ser cada vez mais autoritária, como já estava a ser.

O outro factor positivo foi a eleição de Marcelo Rebelo de Sousa num quadro de “esquerda da direita”, ou seja, ao centro, que, se o Presidente eleito permanecer fiel à sua campanha, pode ajudar também a virar essa alavanca que Passos, Portas e, no fim do mandato, Cavaco, com o apoio político da Europa do PPE, puxaram praticamente até ao chão. Não sei se isto resulta — governo de centro-esquerda mais Presidente moderado —, mas, aqui sim, não vejo outra alternativa hoje. Pode haver amanhã, mas hoje não há, ou há sucesso ou há desastre. Por isso não me é indiferente esta experiência governativa, não sendo este o “meu” governo, por muito que assobiem as intrigas das claques.

Dito isto, no actual contexto europeu, o que se está a passar em Portugal, sendo na verdade apenas uma tímida mudança,  é tratado quase como uma revolução e, como tal, mobiliza as gigantescas forças que estão preparadas para matar no ovo qualquer desvio menor que seja ao cânone alemão. O governo de Costa tem todas as probabilidades de ser derrubado pela Europa do PPE e dos socialistas colados aos alemães, seja directamente por um qualquer “chumbo” europeu, seja indirectamente pela obrigação de aplicar políticas que lhe retirem o apoio parlamentar do BE e do PCP.

O Orçamento de 2016 foi apenas uma amostra e o governo saiu já bastante magoado dessa amostra, que lhe abastardou a política que pretendia seguir, criou desconfianças e distâncias com os seus aliados e colocou-o junto da opinião pública como um governo fragilizado, errático nas finanças e na economia, mesmo incompetente. O comportamento de diktat europeu para as décimas do défice, a sucessão de declarações hostis sobre os “riscos” da política portuguesa de incumprimentos vários às “regras” do Tratado Orçamental, contrasta com a complacência face a idênticos incumprimentos do governo anterior, que, como era “amigo”, tinha margem de manobra e podia no fim esnobar dos relatórios do FMI, que hoje brande contra o PS.

Aliás, a dureza e hostilidade que existem contra o governo de Costa, contrastam com a vontade dos principais dirigentes europeus darem a Cameron medidas que significam recuos importantes (e que também estão nos Tratados) em matéria de liberdade de movimentos e direitos sociais dos emigrantes, para que este volte com um frágil papel para convencer os eleitores ingleses que afinal, com uma longa lista de opting out, ainda podem continuar na Europa. Ou seja, em matéria de direitos sociais, a mesma Europa que não cede a Portugal uma décima no défice sem vilipendiar um governo eleito, está disposta a abdicar perante a pressão inglesa. Na economia do “ajustamento”, não há um milímetro de cedência às “regras”, nos direitos sociais, tudo é negociável.  Por tudo isto, a “Europa” actual, Schäuble, Dijsselbloem, Moscovici, Dombrovskis, mais as suas cortes de funcionários zelosos, a última coisa que desejam é que possa haver qualquer mitigado sucesso de um governo que está a cometer esse crime de lesa-economia que é “reverter” salários e pensões, taxar fundos e bancos e não ao contrário.

O braço armado desta política é, hoje, em Portugal o PSD de Passos, que está convencido de que o seu regresso ao poder é a curto prazo. Passos continua a comportar-se como se fosse um Primeiro-ministro usurpado, de bandeirinha governamental na lapela, a fazer falsas inaugurações, e anda na Europa, o seu grande aliado, a instigar a fronda contra a política do governo e a falar para a as agências de rating e os mercados mostrando-lhes qual o sentido político que pode ter em Portugal uma subida de juros ou um abaixamento de rating: destruir o governo “deles”. Sempre que falam em “preocupações”, mesmo com análises falsas como as das subidas de juros há uma semana, percebe-se muito bem que mais do que preocupações são desejos.

PS, PCP e BE incitaram a sua experiência fora do “arco da governação”, derrubando um governo assente no partido que ganhou as eleições, e apoiando um partido que as perdeu. O primeiro não tinha maioria parlamentar, o segundo tinha, por isso o novo governo tem toda a legitimidade, mas parte sempre fragilizado e só pode superar essa fragilidade pela qualidade e integridade da governação. Ora esse acrescento de legitimidade está a fazer-se no meio de uma ecologia venenosa, num terreno armadilhado e com forças poderosas muito para além de uma apatia desconfiada, numa actuação agressiva.

Tem a hostilidade aberta dos meios de comunicação social, salvo raras excepções, que se comprometeram com as principais ideias do “ajustamento”, quer com proselitismo, como aconteceu com muita imprensa económica, quer interiorizando o modo como se colocam os problemas com a “gramática” dos “ajustadores”. O “não há alternativa” entrou profundamente no espaço mediático e no espaço público e, por isso, qualquer inversão, “reversão” como agora se diz, é vista como uma blasfémia incompetente, uma cornucópia de custos por pagar, um risco de bancarrota ao virar da esquina. A “economia”, como eles a pensam, tornou-se única e inquestionável e por isso o mundo ou é de Sócrates e da bancarrota ou é de Passos e da troika, não há meio termo.

Este comportamento reflecte também o dos principais interesses económicos presentes na governação do PSD-CDS, e que com eles formaram uma forte aliança, assente no primeiro governo em Portugal que se pretendia comportar como uma empresa, pensava como se o país fosse uma empresa, despedia para flexibilizar, diminuía salários e pensões, e acima de tudo queria quebrar a espinha a essas sobrevivências arcaicas do 25 de Abril como eram sindicatos e greves. Esses interesses económicos, que são de uma parte da economia, e não necessariamente da mais eficaz, sentem-se também usurpados do instrumento da governação, e por isso farão a vida negra ao PS, até o derrubarem ou o comprarem em todo ou à peça.

Face a esta ecologia, o PS comporta-se como se pudesse continuar a governar como sempre fez, dá umas coisas a uns e espera sentado pela sua fidelidade; tira umas coisas a outros e depois assusta-se, recua e avança como pode. Ainda não interiorizou o preço que tem a pagar se esta experiência falhar e não tem sentido de urgência face aos riscos, principalmente europeus que estão aí à porta. A “Europa” actual quer a queda do governo Costa e por isso o humilha com novo pacote de austeridade, e força a ruptura com o BE e o PCP. Sim, porque o PS num dilema, vai escolher a “Europa” e deixar o país ao PSD e CDS.

Por sua vez, BE e PCP parecem também não ter percebido que vai haver um antes e um depois dos acordos que fizeram, e que nada voltará a ser como dantes, conforme eles falharem ou tiverem sucesso. Se falharem voltarão a ter uma função meramente tribunícia, agravada pelo desespero dos seus eleitores quando, por uma governação à direita que será agressiva e vingativa, perceberem o país sem esperança em que estão. Partirão por dentro pela radicalização e perderão ainda mais relevo social para fora das suas fronteiras militantes.

PS, BE e PCP ou reforçam de qualquer modo a coordenação política, que lhes permita ganhar algum ânimo colectivo e defrontar em conjunto e de forma capaz toda a tempestade que cai e vai cair sobre o governo, ou vão ter um lindo enterro. Lindo porque deve estar sol, mas só por isso.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Coisas que eu escrevo noutros "sítios"...

Foto by Jose Coelho

"Nunca os invernos me pareceram tão tristes e longos. O vento a uivar pelas frestas que sempre consegue achar nas portas e nas janelas, por mais perfeitas que sejam. O tamborilar monótono da chuva lá fora. O silêncio inquietante das ruas quase desertas onde se sucedem casas com as portas trancadas pela ausência de quem as habitou, janelas às escuras como olhos que cegaram e há muito deixaram de vislumbrar qualquer centelha de luz. Resta o aconchego do lume. Mas até esse, apenas aquece o corpo por fora. Por dentro, a nossa alma continua gelada, tão grande é a melancolia que de tudo isto emana. À nossa volta só abunda agora a solidão. Nem mesmo o vistoso crepitar das chamas e o alegre estalar das brasas em combustão conseguem animar tão silenciosos serões..."

José Coelho 
em 15-2-2015

terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

O mundo (ainda) tem...


Foto by José Coelho

Tem gente...
Que cai e se levanta.
Tem gente rica e humilde.
Tem gente pobre com riqueza de espírito.
Tem gente sofrida com sorrisos para os outros.
Tem gente cansada com energia para dar.
Tem gente doente que deseja saúde para todos.
Tem gente com fome que partilha o seu pedaço de pão.
Tem gente que cuida sem ser cuidada.
Tem gente que chora a perda alheia e aguenta firme as suas perdas.
Tem gente que falha e tenta de novo.
Tem gente amputada que dá a "mão".
Tem gente enganada que confia. 
Tem gente angustiada que acalma o coração do amigo. 
Tem gente destroçada que empurra a vida.

É, tem por aí essa gente toda a todo o momento que se eleva acima de si mesma e continua. 
Continua a ser aquilo que melhor o ser humano tem... um espírito vivo, com vida para si, para os outros e para o mundo.

Abençoados os espíritos vivos com vida!

Miguel Lucas

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Coisas que leio...

Imagem copiada do Google

Erropa

Nos últimos dias, a direita torceu para que a Comissão Europeia boicotasse o orçamento do novo governo - que não era credível, que não ia ser aceite, que era uma ficção, que não passava de uma aventura. Torceu para que o país sofresse uma humilhação, fez lóbi e queixinhas na Europa. Mas à medida que os dias foram passando, meteu a viola no saco. Parece que, para desgosto da “direita patriótica”, o país não foi esmagado nas negociações.

Ainda assim, o vai e vem orçamental entre Bruxelas e Lisboa confirmou sinais preocupantes. Primeiro, que a União Europeia insiste numa deriva autoritária, baseada numa agenda ideológica a favor da austeridade, cujo único efeito é agravar as desigualdades e a distância entre o norte e o sul, o centro e a periferia. Segundo, que os mercados pretendem continuar a ter ganhos especulativos com as dívidas soberanas e que a União Europeia, ao invés de lhes fazer frente, recomenda que, em nome deles, se continue a sacrificar as condições de vida da sua gente. Terceiro, que a única regra é a arbitrariedade, como se verificou a propósito do tal “défice estrutural”, que afinal não tem nenhum critério objetivo, sendo antes uma expressão manipulável ao sabor das circunstâncias, para encobrir decisões exclusivamente políticas da Comissão. Não fossem os acordos realizados no Parlamento, e mais teria sido aniquilado.

Como lembrava recentemente Ricardo Paes Mamede, o memorando da troika para o nosso país falhou os seus três objetivos: equilibrar as contas públicas, melhorar a competitividade da economia e estabilizar o sistema financeiro. No que diz respeito às contas públicas, o efeito foi aumentar ainda mais a dívida. A competitividade da economia assentou no empobrecimento e na repressão do consumo. E o sucesso da “estabilização do sistema financeiro” é uma anedota que se conta em duas siglas: BES e BANIF. Porquê a insistência, então?

Uma das hipóteses mais plausíveis é esta: a Comissão Europeia não quis apenas mostrar os dentes a Portugal. Quer, sobretudo, prevenir que no Estado Espanhol, onde o Podemos foi o grande fenómeno das eleições, ninguém se atreve a imitar a solução portuguesa. E no entanto, não tenhamos ilusões, estamos sempre a falar de compromissos mínimos.

O Orçamento de Estado traz a recuperação de rendimentos prevista nos acordos (subida do salário mínimo, atualização – muito tímida – das pensões, recuperação de apoios sociais, eliminação da sobretaxa do IRS e dos cortes salariais), traz regras de justiça social (como a proteção contra penhoras) e até novas medidas positivas, que são vitórias importantes, como o fim da escandalosa isenção de IMI para os fundos imobiliários ou uma contribuição extraordinária da banca, o setor mais poupado ao longo dos últimos anos. É muito melhor do que o que havia no passado? Claro que é, e nem tem comparação. Mas ainda assim, sejamos rigorosos, não haverá mais dinheiro para os hospitais ou para as universidades, a maioria dos desempregados continua sem subsídio e a pobreza continua a fazer parte do padrão de desigualdades do país. O problema da dívida e dos seus juros fica por resolver e impede o investimento. E isto deve fazer-nos pensar. Afinal, que Europa é esta, que deixa morrer quem a procura e que asfixia quem nela vive, tratando os direitos humanos e a democracia como um obstáculo ao “regular funcionamento das instituições”?

José Soeiro 
in Expresso 05.02.2016 às 12h01

Quem diz que a justiça não funciona?


Copiei do Facebook (Deve ser brincadeira de carnaval! Só pode...)